O orgulho e a emoção brotavam dos milhares de palestinos reunidos em Ramallah. “Este é o dia mais feliz da minha vida”, dizia um membro da Autoridade Palestina. Há muitos anos que não se via palestinos tão felizes e cheios de orgulho, fazendo corpo com seu presidente. Não temos ilusões. “Sabemos que isso é só um começo, um passo curto em uma história muito longa, mas não é um passo vazio, não é um passo violento, é um passo que nos legitima, que nos faz visíveis aos olhos do mundo"
Às vezes a história atravessa as entranhas, é música, cor, bandeiras, cantos e o poema de Mahmud Darwich que o locutor da praça Al-Manara vai recitando enquanto a multidão palestina que veio escutar Mahmud Abbas apresentar, perante a ONU, o pedido de reconhecimento do Estado Palestino, celebra essas palavras feitas de amor e alento: “eu nasci aqui e meu sonho é morrer aqui”. Os cantos e a alegria se fizeram mais potentes quando os homens do palanque foram dizendo, um após outro, os nomes dos países que apoiam o Estado Palestino.
Antes, os organizadores da concentração organizada na praça central de Ramallah tinham destacado as frases mais significativas pronunciadas pelos líderes mundiais nas Nações Unidas. A da presidenta argentina dizia: “com a Palestina como Estado 194 da ONU o mundo será mais seguro e mais justo”. A Autoridade Palestina quis evitar os distúrbios, mas os jovens foram mesmo assim para as imediações do check-point de Kalandia jogar pedras nos soldados , que respondiam do lado de dentro do muro. Cenas repetidas, desproporcionais, na história destes dois povos: jovens com bodoques e pedras, soldados treinados e com armas modernas.
A sexta-feira começou com proibições. Pela rua central de Jerusalém, Jaffa Street, um grupo de israelenses manifestava-se livremente de bicicletas contra a circulação de automóveis. 600 metros abaixo, os árabes tinham restringida a passagem ao núcleo mais denso da Cidade Velha, a Esplanada das Mesquitas. Israel deslocou cerca de 22 mil homens para garantir a segurança. Entre a porta de Herodes e a de Damasco, do mesmo modo que nos outros acessos à Cidade Velha, os palestinos homens menores de 50 anos tinham a entrada proibida. “Eles controlam meu destino e minha liberdade quando tem vontade”, dizia com raiva Hamad, um habitante de Jerusalém Oriental. “Mas não importa”, acrescentou, “ninguém nos tirará o orgulho de viver esse dia”.
O orgulho e a emoção brotavam dos milhares de palestinos reunidos em Ramallah. “Este é o dia mais feliz da minha vida”, dizia um membro da Autoridade Palestina. Há muitos anos que não se via palestinos tão felizes e cheios de orgulho, fazendo corpo com seu presidente. Não temos ilusões. “Sabemos que isso é só um começo, um passo curto em uma história muito longa, mas não é um passo vazio, não é um passo violento, é um passo que nos legitima, que nos faz visíveis aos olhos do mundo, um passo que veio desde cima para dar dignidade a nós, os de baixo”, dizia Nabil, outro palestino da Praça Al Manara. Olhos cheios de lágrimas, negros, profundos, olhos que esqueceram em um instante as humilhações sofridas. Tinha vindo com as chaves da casa na qual viviam seus avós, expulsos de suas terras pela ocupação israelense. Só lhe tinha sobrado isso, mas saltava como uma criança com as chaves na mão.
O governo de Benjamin Netanyahu fez previsões dramáticas. Antecipou mortos, brigas populares, piquetes, levantes e distúrbios que, em grande medida, não ocorreram. “Este é o dia da verdade e não o dia da violência”, repetiam os dirigentes da Autoridade Palestina. O Executivo israelense insistiu nesse discurso: os palestinos sempre foram, são e serão uma ameaça para a segurança de Israel. Não ocorreu o esperado. A Autoridade Palestina também se meteu no jogo e agiu para aplacar os excessos. Era um dia de dignidade e não para a morte. Mas houve uma: Issam Kamal Odeh, um palestino de 35 anos que protestava com um grupo de 400 pessoas na localidade de Qusra, ao norte dos territórios, em Naplusa. Os colonos da zona provocaram o enfrentamento. Montaram uma contra-manifestação para defender a propriedade desse território. Palestinos e colonos se enfrentaram a pedradas. O exército israelense abriu fogo e Issam Kamal Odeh caiu nessa refrega.
O oficialismo evidente dos festejos de Al Manata, praça rebatizada Praça Arafat, não mascarou a autenticidade das expressões de alegria. O chamado “dia da verdade” foi paradoxal. As pessoas terminaram gritando o nome de seu presidente, Mahmud Abbas, mas este dirigente seco, sem encantos nem muito carisma, também arrasta um déficit de legitimidade democrática substancial. Ontem subiu ao céu do reconhecimento. Os palestinos gritaram seu nome, junto ao nome de Arafat. Façanha de um instante que ainda não garante o caminho da paz, nem tampouco o duro trabalho da reconciliação palestina entre as lideranças da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, controlada pelos fundamentalistas do Hamas. O Hamas se opõe a tudo, começando pelo pedido de reconhecimento do Estado Palestino na ONU e terminando pela própria existência de Israel.
O Hamas quase não existe na Cisjordânia. A polícia secreta palestina segue-os de perto, não os deixa falar nem existir. Mahmud Abbas e o primeiro ministro de Gaza, Ismail Haniyé, estão separados por um abismo, que não é só político, mas também territorial: Gaza fica do lado oposto ao da Cisjordânia. Há duas palestinas que precisam ser unidas.
Mas a ilusão de uma terra reconhecida, o espaço que o tema palestino ocupou rapidamente na comunidade internacional, a maioria esmagadora de países que apoia o Estado Palestino, tudo isso deixou uma sensação de novo amanhecer, de perspectiva tangível. Orgulho e alegria sem enganos, alegria lúcida, como as palavras de Mahmud Anhel, um comerciante palestino de 50 anos que saltava e cantava com sua mulher e seus filhos na Praça Arafat: “o que mais podemos fazer, tínhamos o futuro bloqueado e agora surgiu isso, quase nossa única solução. É emocionante e importante. Admito e admitimos que talvez o fracasso nos aguarde, mas isso é novo como a água fresca, novo e diferente”.
Qais Abu, outro palestino da praça, mais jovem e combativo, dizia, com uma bandeira palestina na mão e um retrato de Mahmud Abbas na outra: “sabe que o mundo se deu conta de coisa com essa história da ONU. Todos falam e falam de Nova York da liberdade, liberdade daqui, liberdade de lá, mas o único povo que não a tem é o nosso porque vivemos sob ocupação. Se isso ficar claro teremos ganho um século de reconhecimento sem disparar um só tiro”.
Já é tarde, Agora, Jerusalém oriental também festeja, atravessando a meia noite. Carros com frondosas bandeiras palestinas circulam pela cidade, na artéria que circunda a Cidade Velha. O mesmo grito se repete a cada automóvel, como um eco ressoando no coração da noite de Jerusalém Oriental: “Palestina Livre”. Um sonho. Uma esperança. Uma condição para, enfim, viver em paz.
Antes, os organizadores da concentração organizada na praça central de Ramallah tinham destacado as frases mais significativas pronunciadas pelos líderes mundiais nas Nações Unidas. A da presidenta argentina dizia: “com a Palestina como Estado 194 da ONU o mundo será mais seguro e mais justo”. A Autoridade Palestina quis evitar os distúrbios, mas os jovens foram mesmo assim para as imediações do check-point de Kalandia jogar pedras nos soldados , que respondiam do lado de dentro do muro. Cenas repetidas, desproporcionais, na história destes dois povos: jovens com bodoques e pedras, soldados treinados e com armas modernas.
A sexta-feira começou com proibições. Pela rua central de Jerusalém, Jaffa Street, um grupo de israelenses manifestava-se livremente de bicicletas contra a circulação de automóveis. 600 metros abaixo, os árabes tinham restringida a passagem ao núcleo mais denso da Cidade Velha, a Esplanada das Mesquitas. Israel deslocou cerca de 22 mil homens para garantir a segurança. Entre a porta de Herodes e a de Damasco, do mesmo modo que nos outros acessos à Cidade Velha, os palestinos homens menores de 50 anos tinham a entrada proibida. “Eles controlam meu destino e minha liberdade quando tem vontade”, dizia com raiva Hamad, um habitante de Jerusalém Oriental. “Mas não importa”, acrescentou, “ninguém nos tirará o orgulho de viver esse dia”.
O orgulho e a emoção brotavam dos milhares de palestinos reunidos em Ramallah. “Este é o dia mais feliz da minha vida”, dizia um membro da Autoridade Palestina. Há muitos anos que não se via palestinos tão felizes e cheios de orgulho, fazendo corpo com seu presidente. Não temos ilusões. “Sabemos que isso é só um começo, um passo curto em uma história muito longa, mas não é um passo vazio, não é um passo violento, é um passo que nos legitima, que nos faz visíveis aos olhos do mundo, um passo que veio desde cima para dar dignidade a nós, os de baixo”, dizia Nabil, outro palestino da Praça Al Manara. Olhos cheios de lágrimas, negros, profundos, olhos que esqueceram em um instante as humilhações sofridas. Tinha vindo com as chaves da casa na qual viviam seus avós, expulsos de suas terras pela ocupação israelense. Só lhe tinha sobrado isso, mas saltava como uma criança com as chaves na mão.
O governo de Benjamin Netanyahu fez previsões dramáticas. Antecipou mortos, brigas populares, piquetes, levantes e distúrbios que, em grande medida, não ocorreram. “Este é o dia da verdade e não o dia da violência”, repetiam os dirigentes da Autoridade Palestina. O Executivo israelense insistiu nesse discurso: os palestinos sempre foram, são e serão uma ameaça para a segurança de Israel. Não ocorreu o esperado. A Autoridade Palestina também se meteu no jogo e agiu para aplacar os excessos. Era um dia de dignidade e não para a morte. Mas houve uma: Issam Kamal Odeh, um palestino de 35 anos que protestava com um grupo de 400 pessoas na localidade de Qusra, ao norte dos territórios, em Naplusa. Os colonos da zona provocaram o enfrentamento. Montaram uma contra-manifestação para defender a propriedade desse território. Palestinos e colonos se enfrentaram a pedradas. O exército israelense abriu fogo e Issam Kamal Odeh caiu nessa refrega.
O oficialismo evidente dos festejos de Al Manata, praça rebatizada Praça Arafat, não mascarou a autenticidade das expressões de alegria. O chamado “dia da verdade” foi paradoxal. As pessoas terminaram gritando o nome de seu presidente, Mahmud Abbas, mas este dirigente seco, sem encantos nem muito carisma, também arrasta um déficit de legitimidade democrática substancial. Ontem subiu ao céu do reconhecimento. Os palestinos gritaram seu nome, junto ao nome de Arafat. Façanha de um instante que ainda não garante o caminho da paz, nem tampouco o duro trabalho da reconciliação palestina entre as lideranças da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, controlada pelos fundamentalistas do Hamas. O Hamas se opõe a tudo, começando pelo pedido de reconhecimento do Estado Palestino na ONU e terminando pela própria existência de Israel.
O Hamas quase não existe na Cisjordânia. A polícia secreta palestina segue-os de perto, não os deixa falar nem existir. Mahmud Abbas e o primeiro ministro de Gaza, Ismail Haniyé, estão separados por um abismo, que não é só político, mas também territorial: Gaza fica do lado oposto ao da Cisjordânia. Há duas palestinas que precisam ser unidas.
Mas a ilusão de uma terra reconhecida, o espaço que o tema palestino ocupou rapidamente na comunidade internacional, a maioria esmagadora de países que apoia o Estado Palestino, tudo isso deixou uma sensação de novo amanhecer, de perspectiva tangível. Orgulho e alegria sem enganos, alegria lúcida, como as palavras de Mahmud Anhel, um comerciante palestino de 50 anos que saltava e cantava com sua mulher e seus filhos na Praça Arafat: “o que mais podemos fazer, tínhamos o futuro bloqueado e agora surgiu isso, quase nossa única solução. É emocionante e importante. Admito e admitimos que talvez o fracasso nos aguarde, mas isso é novo como a água fresca, novo e diferente”.
Qais Abu, outro palestino da praça, mais jovem e combativo, dizia, com uma bandeira palestina na mão e um retrato de Mahmud Abbas na outra: “sabe que o mundo se deu conta de coisa com essa história da ONU. Todos falam e falam de Nova York da liberdade, liberdade daqui, liberdade de lá, mas o único povo que não a tem é o nosso porque vivemos sob ocupação. Se isso ficar claro teremos ganho um século de reconhecimento sem disparar um só tiro”.
Já é tarde, Agora, Jerusalém oriental também festeja, atravessando a meia noite. Carros com frondosas bandeiras palestinas circulam pela cidade, na artéria que circunda a Cidade Velha. O mesmo grito se repete a cada automóvel, como um eco ressoando no coração da noite de Jerusalém Oriental: “Palestina Livre”. Um sonho. Uma esperança. Uma condição para, enfim, viver em paz.
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