Por Carlos Chagas.
Vale o preâmbulo de que toda nação tem direito à autodeterminação. Quando
submetida ou subjugada por outra, caracteriza-se violência inadmissível, a menos
que seu povo careça de condições econômicas, políticas e culturais de
governar-se sozinho.
O Tibet, tradicionalmente, forma uma nação, e vem sendo dominado pela China
há décadas ou, se quiserem, há séculos. Tem os tibetanos o direito indiscutível
de independência.
Só que surge um problema: por que, de repente, eclode não apenas no Tibet,
mas no mundo inteiro, intensa campanha de resistência e até de rebelião contra
o governo de Pequim?
Certas coisas não acontecem de graça. A China incomoda meio mundo, ou mais.
Aliás, já incomodava desde 1949, quando Mao Tsetung tomou o poder e estabeleceu
o comunismo à moda chinesa, mais duro e inflexível do que outros espalhados pelo
planeta.
Mesmo agora admitindo uma espécie de capitalismo singular, ou por causa
disso, a China entrou feito faca na manteiga na economia ocidental. Através de
suas multinacionais, as grandes potências financeiras aceitaram, até porque
tiraram e tiram proveito das mudanças promovidas por Deng Tsiauping. Afinal, a
mão de obra que utilizam em território chinês é infinitamente pior remunerada do
que em seus países de origem. Ganham rios de dinheiro, as multinacionais e a
China, mas o crescimento econômico e político de nossos antípodas, importa
repetir, incomoda e significa um perigo dos diabos para o capitalismo mundial,
nas próximas décadas.
Assim... Assim, interessa aos incomodados criar dificuldades e reduzir ao
máximo a influência chinesa no mundo. Que melhor oportunidade haveria do que
desacreditar a China e seu regime do que quando mais um passo significativo está
prestes a ser dado para ampliar sua presença em todos os continentes? Qual? A
evidência de que enquanto a Europa e os Estados Unidos enfrentam dificuldades
sem conta, os chineses nadam de braçada no rumo da consolidação de sua
economia.
Explica-se, por aí, a crise no Tibet. De repente, os vassalos do Dalai-Lama
vão para as ruas em suas principais cidades, protestando contra a dominação
chinesa. Mais estranho ainda, em capitais da Europa e adjacências multidões
invadem as embaixadas da China, queimam suas bandeiras e, como por milagre,
acenam com milhares de bandeiras do Tibet, costuradas e distribuídas sabe-se lá
por quem.
Corrigindo, sabe-se muito bem: pelos artífices da política de dominação
elaborada nas sombras, nos becos inidentificáveis e nos gabinetes secretos e
refrigerados dos donos do poder mundial. Os mesmos que fomentam rebeliões onde
quer que surjam obstáculos à sua prevalência universal. No caso, não apenas
rebeliões armadas, mas movimentos culturais, religiosos, familiares, sociais e
congêneres.
Agiram com sucesso para derrubar o Muro de Berlim e levar a União Soviética
à extinção. Não que aquela nação deixasse de dar motivos para ser relegada ao
lixo da História, mas até o Papa João Paulo II integrou-se na conspiração.
Tinham feito o mesmo no Chile, na Guatemala, até no Brasil, só para ficarmos
nos tempos modernos.
Parece óbvio que não podem virar a China de cabeça para baixo, mas terão
sucesso parcial se puderem criar empecilhos ao seu crescimento e à sua
influência, fomentando insurreições como a que acontece no Tibet, tudo com o
objetivo de travar e até desmoralizar a nova superpotência.
Em suma, tem azeitona nessa empada, com a evidente colaboração da mídia
internacional. Erra quem supuser apenas uma operação rocambolesca da CIA, porque
essa trama envolve muito mais agências, empresas, governos, recursos e
quadrilhas. Os instrumentos de conflito são outros, neste início do novo século.
Nada de bombas atômicas e batalhas de tanques. Minar os adversários por dentro
pode ser mais complicado, ainda que mais eficiente. A China que se cuide.
JOGO DE CENA.
No Congresso, não se encontra um só parlamentar que concorde, retoricamente,
com a violência do governo em governar com medidas provisórias. Até o PT se
insurge, ainda que apenas no gogó. Todo mundo critica a edição de éditos que não
são nem de urgência nem de relevância, como manda a Constituição. Protestam
deputados e senadores contra o trancamento das pautas enquanto as medidas
provisórias não são votadas. Querem mudar as regras do jogo, ironicamente
alternando-se no apoio ou na condenação dessa singular forma de submissão do
Poder Legislativo.
O diabo é que nada fazem, quando poderiam fazer. Dormem nas gavetas do
Congresso mil e um projetos alterando a sistemática das medidas provisórias. Na
hora de dar seguimento às mudanças, encolhe-se a maioria e até segmentos das
minorias fazem ouvidos moucos aos próprios reclamos.
O palácio do Planalto dispõe de instrumentos para conter qualquer movimento
contrário aos seus interesses. Nomeações, favores, benesses – tudo funciona de
acordo com seus objetivos. Se a presidente Dilma exige que as coisas
continuem como sempre, não há quem ouse enfrentá-la. Continuará soltando seus
ucasses.
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