domingo, 19 de agosto de 2012

PRIVATIZANDO AS PRIVATIZAÇÕES ou AS VIRTUDES DA INOPERÂNCIA


Por Carlos Chagas.
A vida costuma ser mais fascinante e surpreendente do que a ficção. Muitas  vezes, para  dar alento a quem resiste. Ontem, dia do retrocesso,  o governo Dilma Rousseff anunciou  nova onda de privatizações, quer dizer, de doação de patrimônio público a uns poucos  privilegiados que se  valem  da ficção para enriquecer e aumentar seu  poder.   Só que  a vida sempre   revela a  fraqueza do embuste.                  
Caiu por terra, em 24 horas,  a mentira de ser a iniciativa privada mais  eficiente,  motriz primeira  do desenvolvimento, enquanto o Estado só cria despesas e gera desperdício e corrupção.
Ficamos sabendo estarem no  limiar  da falência as empresas aéreas Tam  e Gol, além de  penduricalhos. Basta ler seus balanços, mesmo maquiados. Seguem no rumo da Panair, da Varig, da Real, da Cruzeiro do Sul, da Transbrasil, da Vasp e de   outras. Seu prejuízo é de centenas de  milhões. E mais crescerá. Se ainda teimam em voar, e será por pouco tempo, a causa repousa na ajuda nem sempre honesta  dos cofres públicos,  das benesses fiscais e do sacrifício de seus funcionários.
Demonstra a natureza das  coisas  que certas atividades devem obrigatóriamente  ser estatais, quer dizer, pertencer ao todo,  não a  partes privilegiadas. Os transportes públicos são uma delas, tanto faz se aéreos, terrestres ou marítimos.  Da mesma forma  a educação, a saúde e a segurança públicas.  Sem esquecer  a indústria pesada, a geração de energia e   o controle do  sistema financeiro.
Nas últimas décadas assistimos o desmonte do patrimônio estatal, isto é, do povo,  em nome de uma falsa eficiência construída às custas da compressão  dos salários e das dificuldades  do trabalhador, favorecendo  grupinhos que sem nada investir apropriam-se dos investimentos públicos e insistem  em   proclamar as virtudes de sua inoperância. Os transportes aéreos constituem apenas um  exemplo, aqui referido por conta da  coincidência entre a mentira quarta-feira,  e a verdade de hoje, quinta.
Entre outros objetivos, o PT formou-se para sustentar a defesa do poder público,  a prevalência da sociedade sobre  minorias egoístas. O tempo passou e os companheiros cederam à  tentação de valer-se da estratégia que os beneficiaria e transformaria em  comensais do elitismo. Que um sociólogo tivesse traído ideais antes  apregoados por ele, tratou-se de uma individualidade fraca. Mas admitir essa mudança numa vanguarda   que um dia   pretendeu a reconquista do coletivo e a prevalência do social, deve ter doído muito   em quem neles acreditou. Talvez por isso boa parte debandou. Os que ficaram, transfigurando-se,  aliaram-se à cartilha dos  adversários do passado. Hoje, são cultores do neoliberalismo. Servem-se dele para exercer e preservar  o poder que não merecem mais, cegos diante da maré que  logo os asfixiará, como vai acontecendo lá fora. 
Que diferença existe entre o nosso governo e  aqueles que na Alemanha, Inglaterra, Espanha, Grécia, Portugal e alhures praticam,   às custas dos direitos sociais, a política perversa da doação  de bens públicos? Servem aos  mesmos   que através dos tempos tem sido os geradores da injustiça, da perversidade e das crises inevitáveis.
Pois bem:  mais cedo do que imaginavam com a própria  ficção,   engolem a resposta da vida. Vão fazer o quê? Privatizar a privatização das empresas aéreas? Ou abrir ainda   mais as burras do tesouro para preservá-las por outros quinze minutos?

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