segunda-feira, 30 de abril de 2012

SEM MOTIVOS PARA COMEMORAR


Por Carlos Chagas
Em especial na primeira metade do século passado, comemorava-se com entusiasmo o Dia do Trabalho, a transcorrer amanhã. Melhor seria dizer Dia do Trabalhador, porque à exceção dos Estados Unidos, que escolheram outra  data, assalariados do  mundo ocidental celebravam a existência  de direitos conquistados a duras penas.

No Brasil, antes de 1930, não havia o horário de oito  horas. O empregado trabalhava quantas horas o  patrão determinasse. Muito menos o salário mínimo: pagava-se ao sabor das preferências do pagador. Nem proteção ao trabalho do menor nem da gestante: as grávidas eram postas  na rua e aos   meninos  impunham-se  exigências feitas aos adultos, sem a remuneração correspondente.   Inexistiam férias,   aposentadorias e pensões. Nem garantia do trabalho: o cidadão exercia sua profissão por  dez, vinte, trinta  anos na mesma  empresa. Quando a vista falhava e os braços já não suportavam a carga, era simplesmente dispensado. Hospitais públicos para atende-lo, só as Santas Casas da  Misericórdia, de caridade, se não podiam  pagar estabelecimentos e médicos privados. 

Foi Getúlio Vargas que gradualmente estabeleceu  as  prerrogativas sociais,  tanto faz se calcado em experiências de governos fascistas, como o de Mussolini, na Itália, ou  em exemplos marxistas, como na  União Soviética de Lênin e Stalin.

Por isso, todo Primeiro de Maio era dia de festa, com o presidente  delirantemente aplaudido  por multidões em estádios lotados, fosse como governante  provisório,  constitucional ou ditador. Pouco se preocupava o  operário se havia Congresso funcionando ou não. Se a imprensa era censurada e os partidos políticos, proibidos. Suas prioridades eram outras, satisfeitas naqueles dias. Sem a emissão de juízos de valor,  constata-se apenas ser assim que as coisas se passavam, para horror de quantos se insurgiam democraticamente  contra a ditadura e para  satisfação de muitos mais aquinhoados com   direitos sociais  e até com a   dignidade no trabalho. 
Acrescente-se que parte  da oposição a Vargas devia-se à reação das elites e  dos potentados diante da obrigação de respeitar e remunerar a contento  o trabalhador.  O bolso, mais do que  o ideal, impulsionou muitos que ajudaram a depor a ditadura. Costuma funcionar nessas horas o faturamento prejudicado, acima e além da  democracia ansiada.

Passou-se o tempo, alternou-se por diversas vezes a balança política.  À queda do ditador seguiram-se períodos de liberdade, mas,  também,   de congelamento e até supressão  de direitos sociais. Getúlio voltou, eleito pela maioria da massa popular, matando-se para não ser outra vez  deposto. João Goulart, seu herdeiro, tentou ampliar o leque das reformas e não conseguiu manter-se no poder. Outra ditadura impôs-se, dessa vez militar, sem a contrapartida de favorecer o trabalho e o trabalhador. Depois, de  novo,  a reconstrução democrática, ainda que perigosamente favorável às elites e aos potentados.

Para encurtar a conversa, vale comparar a situação das prerrogativas do trabalho  desde a imposição  do neoliberalismo  de Fernando Henrique Cardoso, mantido ironicamente  pelo primeiro operário a assumir o governo.

Tornou-se irreal a jornada de oito horas, porque só  não  faz horas extras ou não mantém um segundo emprego aqueles que não conseguem. Ou alguém pode   viver com esse ridículo salário mínimo que, ao ser  criado,  bastava para  o trabalhador e sua família enfrentarem despesas de habitação, alimentação, vestuário, transporte, educação e  lazer? Acabou o trabalho do  menor?  Basta ler os jornais e atentar para as  reprimendas que vem das Nações Unidas. Qual a mulher que conseguirá emprego,  se disser estar grávida? Férias, se o empregado não conseguir vende-las, gozará fazendo bicos de espécies variadas. Aposentadorias e pensões vem sendo cada vez mais comprimidas, faltando pouco para estarem niveladas por baixo, pelo salário mínimo, exceção de algumas categorias privilegiadas. Sumiu faz muito a garantia de trabalho que impedia demissões após dez anos na mesma empresa. O SUS, que substituiu os institutos de previdência, tornou-se vergonha nacional.

Existirão realmente motivos para se comemorar o Primeiro de Maio?

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