DESATEMOS O NÓ.
CartaCapital sempre entendeu que o “mensalão”, com o
significado de mesada do suborno, nunca foi provado.
Por Mino Carta, da Carta Capital.
Wálter Fanganiello Maierovitch critica a ministra Eliana
Calmon, do Superior Tribunal de Justiça, por ter dito que com o processo do
chamado “mensalão” a Nação julgará o próprio Supremo. Segundo o nosso
colunista, quem será julgado é o procurador-geral da República, Roberto Gurgel,
que denunciou os acusados de participar do esquema criminoso. Procedente ou não
a denúncia? Eis a questão.
O fato de que Gurgel mereça a precedência no julgamento da
opinião pública não invalida a ideia da senhora Calmon, na qual sinto a
constatação em lugar da pressão. Não é que o STF faça jus à confiança coral do
povo brasileiro. Nem sempre foi impecável na atuação, pelo contrário. Sem
contar os passos em falso dados por este ou aquele ministro. Primeiro entre
eles, dentro das composições mais recentes, Gilmar Mendes.
Autoritário até a truculência, Mendes é aquele que chamou às
falas o presidente Lula. E denunciou ser vítima do grampo, executado pelos
agentes da Abin, de suas conversas com o amigão Demóstenes Torres, escuta que
nunca houve e, mesmo assim, resultou no desterro para Portugal do chefe da
agência, o honrado delegado Paulo Lacerda, melhor diretor da Polícia Federal
das últimas décadas.
Mendes é sócio de um instituto de ensino, a contrariar a Lei
Orgânica da Magistratura, que exige dedicação exclusiva, e não hesitou em
convocar, na qualidade de professores, colegas do Supremo. Por exemplo, Eros
Grau quando ministro. Tertúlias de felizes e pontuais consumidores de pizza,
convictos de sua impunidade. Mendes é também acusador de Lula ex-presidente, apontado,
um mês depois dos eventos alegados, como autor de pressões para influenciar seu
voto no processo do “mensalão”. Foi desmentido inexoravelmente pelo próprio
ex-ministro Nelson Jobim, anfitrião do encontro com Lula.
Na reportagem de capa desta edição, Mendes volta à ribalta,
e por causa de circunstâncias destinadas a esclarecer de forma decisiva as
razões do seu voto contrário ao envolvimento do ex-governador Eduardo Azeredo
no “mensalão” das Alterosas. A suspeição de Mendes no processo que se inicia é
muito mais que evidente. Talvez não seja o único ministro que a justifica.
Veremos o que veremos. De saída, CartaCapital declara confiar na batuta do
presidente do STF, Ayres Britto, figura de todo respeito.
Que o nó seja desatado, e não pela espada de Alexandre, o
macedônio, é da conveniência da Nação em peso, inescapável juiz dos
comportamentos do Supremo diante de uma questão tão crucial na perspectiva do
futuro do País, emergente superdotado e até hoje cerceado pelos herdeiros da
casa-grande, elite (elite?) prepotente e hipócrita, feroz e covarde. Não é por
acaso que o Brasil contou com torturadores eméritos, capatazes e jagunços
imbatíveis nos seus misteres. E até hoje é incapaz de negar, pela força da
Justiça, a validade de uma lei da anistia imposta pela ditadura civil-militar.
CartaCapital sempre entendeu que o “mensalão”, com o
significado de mesada do suborno, nunca foi provado, embora houvesse evidências
de outros crimes, igualmente graves. Espera agora por um julgamento digno da
Suprema Corte de um país democrático e civilizado, sem excluir de pronto
possibilidade alguma.
De sorte a cumprirmos dignamente o compromisso com o
jornalismo honesto, ancorado na verdade dos fatos, a partir desta edição
passamos a publicar a contribuição de um grupo de professores de Direito da PUC
de São Paulo, análise estritamente técnica das condições iniciais e dos
desenvolvimentos do processo. Trata-se de um trabalho que alia profundidade à
isenção, e que prosseguirá ao longo de toda a demanda. CartaCapital faz questão
de diferenciar-se de quem se antecipa à sentença final na impafiosa certeza de
ter já identificado executores e mandantes. Esperamos, apenas, que se faça
justiça, a bem do Brasil.
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