terça-feira, 23 de agosto de 2011

PREÇOS, O ABSURDO BRASILEIRO

Martha Beck e Paulo Justus, de O GloboQuem é brasileiro sabe e sente no bolso: o país é um dos mais caros do mundo quando se trata de preços de itens como energia elétrica, combustíveis e passagens aéreas. Se o Brasil participasse de uma Olimpíada que premiasse os países com os maiores custos, certamente estaria entre os medalhistas nessas modalidades. A valorização do real está entre os principais fatores recentes que levaram ao aumento dos custos na comparação com outros países nos últimos anos.
Um setor aéreo concentrado e com entraves à concorrência faz com que o Brasil seja hoje o país com as passagens aéreas mais caras do mundo entre os grandes mercados. Levantamento preparado para o GLOBO pela consultoria econômica MicroAnalysis mostra que o quilômetro percorrido de avião nas rotas mais movimentadas - como Rio-São Paulo ou São Paulo-Brasília - custa, em média, US$ 0,36 nos horários de pico (de 6h às 9h e de 18h às 21h). Trata-se de uma tarifa 227% mais cara do que nos Estados Unidos, onde esse valor é de US$ 0,11. Ou 157% maior do que na Europa, onde sai por
US$ 0,14.Segundo o levantamento, a tarifa no trecho São Paulo-Brasília, por exemplo, que representa uma distância de 1.015 quilômetros, custa, em média, US$ 378,37. O valor é quase três vezes maior do que uma tarifa no trecho Nova York-Chicago, que é de US$ 144 e representa uma distância de 1.149 quilômetros. Ainda de acordo com a pesquisa, o trecho Berlim-Paris (1.094 quilômetros), custa US$ 200. Neste caso, a passagem brasileira é quase duas vezes mais cara.
- Quando comparada com outros lugares do mundo, a tarifa brasileira é muito elevada - afirma Cleveland Prates, sócio-diretor da MicroAnalysis e ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
O trabalho da consultoria faz também um levantamento das tarifas para um passageiro que busca uma passagem para embarque no próprio dia em horário de pico. Neste caso, o preço do quilômetro no Brasil é de US$2,41 e só perde para o Canadá, US$ 2,83. Nos Estados Unidos, o valor é de US$ 0,45 e na Argentina, de US$ 0,48. Procurado, o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea) não comentou o estudo.
Segundo a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace), o país tem hoje o terceiro maior custo de energia elétrica para a indústria no mundo, atrás apenas de Itália e Eslováquia. O ranking, elaborado pela Abrace com dados de 2010, analisou custos de 26 países.
- O Brasil vive uma situação curiosa: embora esteja em condição geográfica única no mundo para ter energia barata e renovável, tem uma energia das mais caras do mundo. Isso ocorre por causa de encargos e ineficiências no sistema - diz Paulo Pedrosa, presidente da Abrace.
Outro estudo, sobre o custo da energia residencial, também coloca o Brasil na terceira posição, atrás de Alemanha e Áustria. O levantamento, feito pela Trevisan Escola de Negócios com 17 países, considerou o gasto de uma família que consome 300 quilowatt-hora por mês.
A conta de luz paga anualmente pela família brasileira ficou em US$ 914, contra US$ 1.108,8 na Alemanha e US$ 918 na Áustria. O valor está bem distante dos gastos anuais americanos (US$ 478,8) e mexicanos (US$ 295,2) que tiveram os menores preços da amostra.
A renovação a partir de 2015 de parte das concessões do setor elétrico, que conta com contratos de mais de 50 anos, é a grande esperança para reduzir o valor da conta de luz dos brasileiros. Segundo estimativa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), os novos leilões poderiam cortar o valor médio do megawatt-hora de R$ 90 para até R$ 20, porque os novos contratos já não incluiriam mais a amortização dos investimentos para a construção das usinas, mas apenas os gastos com manutenção.
- Na hidrelétrica, que responde pela maior parte da energia gerada no país, o que é caro é o investimento. Quem entrar nos novos leilões não vai mais contabilizar o investimento, só o custo de operação e manutenção - diz Paulo Skaf, presidente da Fiesp.
O custo dos combustíveis também está entre os maiores do mundo. De acordo com levantamento da Sociedade Alemã para a Cooperação Internacional (GIZ, na sigla em alemão), feito em novembro de 2010, o Brasil tem a segunda gasolina mais cara das Américas, cotada a US$ 1,58 o litro. O país só perde para Cuba (US$ 1,72/litro), que em setembro do ano passado decretou uma alta de 18% no combustível por causa da instabilidade do preço do petróleo.
O Brasil é o único país entre os Bric que está na categoria de países com a gasolina mais cara do mundo, dentre as quatro classificações da GIZ. São economias em que o preço do litro do combustível custa entre US$ 1,47 e US$ 2,54 o litro. Na Índia, a gasolina saiu por US$ 1,45, contra US$ 1,11 na China e US$ 0,84 na Rússia.
A situação é semelhante com o diesel brasileiro, que é também o mais caro entre os Brics e o terceiro mais caro das Américas, cotado a US$ 1,14 o litro, atrás de Uruguai e Cuba. Entre os quatro grupos de países classificados de acordo com a faixa de preço pela GIZ, o Brasil está em segundo lugar, na faixa que tem preço entre US$ 0,85 e US$ 1,36 o litro, por causa de impostos.
Na telefonia, o Brasil fica na posição intermediária, na 53ª entre os 161 países que tiveram a cesta de serviços básicos de telefonia fixa analisada pela União Internacional de Telecomunicações (UIT). Apesar disso, o valor da cesta no país, de US$ 13,43, é superior à média de todos os países (US$ 12) e também o mais alto entre os Brics. Para a análise, a UIT se baseou no valor cobrado em 2009 para uma cesta de serviços de telefonia fixa composta pela assinatura e 30 chamadas locais de três minutos cada, sendo 15 em horário de tarifa reduzida.
Os preços de banda larga também mostram o Brasil como o mais caro entre os Brics. O país é o 97º mais caro entre 161 países analisados no mundo, com valor de US$ 28,033 pela assinatura básica de internet, com 1 gigabyte incluído. Na banda larga, o Brasil fica abaixo da média de todos os países (US$74,15),
distorcida pelos altos preços de países como a República Centro Africana, em que o plano básico custa US$ 1.329,49.

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