terça-feira, 20 de dezembro de 2011

PLACAR SUPERIOR AOS QUATRO A ZERO

Por Carlos Chagas
Nosso futebol voltou do Japão duplamente humilhado e ofendido. Além da goleada do Barcelona sobre o Santos, ficamos sabendo que a Fifa engrossou ainda mais, dizendo-se preocupada e exigindo do Brasil a aprovação total de suas exigências, na votação da Lei da Copa. Segundo o secretário-geral da entidade, vias de acesso aos estádios e aeroportos não vem merecendo o devido cuidado de nossas autoridades, estando atrasadas as obras de infraestrutura.
O secretário-geral Jerome Weicke insistiu na aprovação, pelo Congresso brasileiro, de dispositivo considerando a União obrigada a indenizar a Fifa por ação ou omissão em tudo o que seus dirigentes se considerarem prejudicados. Exemplo: se no dia de um dos jogos da Copa do Mundo cair monumental tempestade, impedindo parte dos que demandariam os estádios de comparecer, caberá ao governo brasileiro indenizar a Fifa pelos lugares vazios e devolver o dinheiro dos bilhetes comprados e não utilizados. No Brasil inexistem, terremotos, tsunamis e atos terroristas, mas se acontecerem, a culpa será do palácio do Planalto, obrigado a ressarcir os organizadores do certame de eventuais prejuízos.
Mas tem mais. Nas ruas e avenidas que conduzem aos estádios, o comércio ficará proibido de anunciar e vender produtos que não aqueles dos patrocinadores da Fifa, como marcas de cerveja, camisetas e tênis. Nos estádios, a lei será rasgada pela permissão da venda de bebidas alcoólicas, mas apenas aquelas que estiverem financiando a entidade. Não haverá, segundo o “preocupado” funcionário, meia-entrada para estudantes.
Convenhamos, pretendem atropelar a soberania nacional para justificar os absurdos lucros que irão auferir. A Lei da Copa dificilmente será votada esta semana, ficando para fevereiro ou março do ano que vem. Se forem atendidas todas as esdrúxulas imposições, o Brasil terá sido derrotado por placar bem superior aos 4 a 0 engolidos pelo Santos.
ALÉM DO CAOS.
Por conta do início das festas natalinas os aeroportos viraram um caos, no fim de semana. Imagine-se agora se na quinta-feira entrarem em greve os controladores de vôo e os funcionários das empresas aéreas. Será o inferno. Conseguirá o governo Dilma agir ao contrário do que agiram, ou não agiram, os governos Lula e Fernando Henrique? A greve é um direito do trabalhador, assim como a população tem direito ao funcionamento dos serviços públicos e privados. Nenhuma iniciativa foi adotada para substituir os grevistas, sequer preparar montes de soldados para funcionarem nos balcões das companhias, coisa que teria sido fácil, desde que preparada com antecedência. Intervenção é substantivo arrancado dos manuais do poder público, apesar de previsto na Constituição e nas leis. Como o andar de cima voa em jatinhos da FAB ou particulares, os passageiros que relaxem e gozem, como no infeliz conselho de uma ex-ministra do Turismo...
MINISTÉRIOS.
Vem de longe o sofrimento e a falta de coragem de nossos presidentes civis. Getúlio Vargas chegou a compor um “ministério da experiência”, em 1951, praticando depois toda sorte de mudanças para atender os partidos e grupos de pressão dispostos ao seu redor. Café Filho rendeu-se aos conservadores e reacionários, apesar de considerado um homem de esquerda. Juscelino Kubitschek acomodou-se com o PSD e o PTB, mas cedeu às idiossincrasias da imprensa, compondo pelo menos três ministérios. Jânio Quadros, cercado de esperanças, formou um “paulistério” de segunda categoria, com raras exceções. João Goulart seguiu o exemplo de Getúlio, mudando de ministros como quem mudava de camisa, sem conseguir a mínima unidade. Depois do interregno militar, onde os partidos não eram consultados nem ouvidos, José Sarney precisou governar um ano com a equipe montada por Tancredo Neves, que por sua vez tinha empenhado a própria saúde na inglória missão de atender o imenso mosaico disposto às suas costas. Fernando Collor seguiu os passos de Jânio Quadros: seu primeiro ministério foi lamentável, e o último, magnífico, não teve tempo impedir seu impedimento. Itamar Franco tentou a união nacional, mas rejeitado pelo PT, governou com a equipe possível, jamais a ideal.
Fernando Henrique e o Lula cederam a seus panos de fundo, anulados um pela privatização desmedida e corrupta, outro pelo mensalão que estraçalhou seu governo.
Agora, Dilma já perdeu um ano de eficiência por conta da lambança de seus aliados. Pouca gente acreditou quando declarou não estar cogitando da reforma em janeiro, porque se mantiver a mesma correlação de forças partidárias no ministério, arrisca-se a formidável malogro.
VOLTA ÀS ORIGENS.
Nos primeiros dias de 1964 o cônsul-geral dos Estados Unidos em São Paulo, David Braddock, enviou nota ao Departamento de Estado: “A União Nacional dos Estudantes caiu na mão dos comunistas ao eleger o estudante José Serra para seu presidente”. O então jovem reformista e revolucionário foi um dos oradores no célebre e funesto comício do dia 13 de março, no Rio, igualando-se em agressões aos americanos a Leonel Brizola, Miguel Arraes e o próprio presidente João Goulart. Precisou exilar-se no Chile, depois Estados Unidos e França. Voltou diferente, fez carreira na social-democracia cada vez mais conservadora, perdeu duas eleições para presidente da República e agora vem sendo tentado a voltar às origens, para disputar pela terceira vez. Será que consegue?

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