segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Às vezes entre a tormenta - Fernando Pessoa

Às vezes entre a tormenta, 
Quando já humedeceu, 
Raia uma nesga no céu, 
Com que a alma se alimenta.
E às vezes entre o torpor 
Que não é tormenta da alma, 
Raia uma espécie de calma 
Que não conhece o langor.
E, quer num quer noutro caso, 
Como o mal feito está feito, 
Restam os versos que deito, 
Vinho no copo do acaso.
Porque verdadeiramente 
Sentir é tão complicado 
Que só andando enganado 
É que se crê que se sente.
Sofremos? Os versos pecam. 
Mentimos? Os versos falham. 
E tudo é chuvas que orvalham 
Folhas caídas que secam.

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