terça-feira, 8 de novembro de 2011

Por Luiz Carlos Azenha, do Blog Vi o Mundo.
O New York Post, tabloide de Rupert Murdoch, é a caricatura de um tabloide de Rupert Murdoch e, de certa forma, do jornalismo de nosso tempo. Mais escancarado, obviamente, já que o Post depende do que vende nas ruas.
Numa era de sociedades ‘encharcadas’ de infotainment e de neurônios sob o cerco feroz de múltiplas mensagens, o Post aperfeiçoou o “jornalismo do grito”: manchetes emocionais, que apelam ao mínimo denominador comum e servem para ‘informar’ escondendo o essencial.
Numa era de incertezas, certezas absolutas, sem nuances ou contextualização.
Qualquer pessoa que visite o acampamento do Occupy Wall Street, numa praça próxima da bolsa de valores de Nova York, vai se surpreender com a tranquilidade, a limpeza e a organização dos manifestantes.
O Post, porém, vem fazendo uma intensa campanha pela desocupação do espaço, ora afirmando que o movimento atrapalha o comércio da região, ora dizendo que tira a tranquilidade dos moradores de uma área essencialmente de escritórios.
O “ápice” da campanha, pelo menos até agora, foi a manchete acima, baseada numa briga entre dois manifestantes.
“Os animais do Occupy Wall Street enlouquecem”, diz o título, para justificar o trocadilho: Zoo-cotti!
Zuccotti Park é o nome do espaço ocupado pelo acampamento. Aliás, é propriedade privada de uma empresa chamada Brookfield Properties, que provavelmente fez a praça ali para poder usar os “air rights”, direitos de construção, em outro lugar.
No interior do tabloide, além das fotos da briga, um texto assinado por Kevin Fasick e Bob Fredericks diz: “Passou do simples caos à pura insanidade. A violência e a depravação continuaram a se acumular no protesto do Occupy Wall Street ontem, quando policiais prenderam 16 pessoas por tentar bloquear a entrada da Goldman Sachs e uma mulher do Alabama se apresentou para relatar outro doentio ataque sexual no Zuccotti Park”.
“Três outros manifestantes foram presos no Zuccotti por se negar a tirar máscaras, inclusive um homem que vestia uniforme militar dizendo que era fuzileiro naval. Usar máscaras durante um protesto é ilegal”, diz ainda o texto.
“Filth”, “horde”, “defiant” são palavras associadas aos manifestantes no tabloide.
“Estamos seriamente sugerindo que se um grupo jihadista ou neonazista entrasse no protesto receberia a mesma indulgência?”, diz uma declaração atribuída a um morador no texto de um editorialista. “Ou a Klu-Klux-Klan!”, disse outro.
No mesmo texto: “‘Grandes pacotes, sem identificação’ estão sendo entregues no parque, ’sem que ninguém cheque o conteúdo’, foi notado. Esta é uma área que — como resultado da proximidade do World Trade Center 4 e da Freedom Tower — está em alerta máximo e na qual buscas aleatórias em grandes containers é a norma”.
[Seriam as famosas armas de destruição em massa do Saddam?, pergunto]
Na mesma página, outro editorialista escreve: “Está se tornando claro durante as últimas semanas que existe ilegalidade no coração do Occupy Wall Street. Ele criou pequenos espaços desgovernados em cidades de todo o país, para os quais os sem-teto, usuários de drogas e criminosos estão se dirigindo”.
Mais adiante: “Os manifestantes pelos direitos civis fizeram seus protestos pacificamente e com dignidade. A diferença entre eles e os do Occupy que desafiam a polícia é a diferença entre heróis do auto-sacrifício e punks e reclamões ideologicamente bêbados”.
Os dois editorialistas, aliás, “militam” nas fileiras da National Review, um bastião dos neocons nos Estados Unidos.
O curioso é que todo o palavreado neofascista — de defesa da ordem e da limpeza social, das forças de segurança e dos cidadãos de bem — se consolida em um tempo de desordem, de angústia social, de desemprego, de aprofundamento da desigualdade  e de risco de colapso econômico.
Talvez não seja coincidência.

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