A Europa assiste nesse momento, com anuência catatônica dos partidos e da mídia, ao poder auto-atribuído dos mercados financeiros para nomear e demitir governos, impondo-lhes metas e políticas que reduzem o Estado, a economia e a sociedade a meros dentes da engrenagem reprodutora do capital a juro. No Brasil, como demonstra a editora de Política de Carta Maior, Maria Inês Nassif, em análise nesta pág., é a mídia que se arroga, de forma mais ostensiva, o papel desse poder paralelo, avocando-se a prerrogativa de inocentar e condenar ministros de Estado, a ponto de tornar o governo Dilma, perigosamente, refém de seus interesses e interditos. Na Europa, de forma desconcertante, as causas da crise são omitidas na dissecação de um colapso cuja origem e manutenção remete ao poder desmedido das finanças desreguladas. Sua supremacia monopolizou a tal ponto a agenda política que hoje encara-se como inevitável responder ao colapso com doses adicionais de suas causas. A mesma lógica auto-propelida alimenta a eterna pauta da corrupção política no Brasil. A ausência de uma presença estatal forte no financiamento das campanhas eleitorais torna partidos, eleitores e eleitos reféns do dinheiro privado. A mesma mídia que usurpa espaços e prerrogativas das instituições democráticas, permite-se, porém, rebaixar a discussão das alternativas a essa distorção para reiterar seu papel auto-atribuído de juiz e jurado das escolhas dos eleitores e governantes. Nos dois casos um poder coercitivo ilegítimo submete a cidadania a desígnios sedimentados à margem do discernimento social. Em nome da eficiência, na Europa, e da transparência, no Brasil, comete-se o rapto ardiloso da democracia para instituir a chantagem permanente contra a sociedade. A lição européia é clara: todos os governantes que cederam a essa lógica foram engolidos por ela. A ver.
(Carta Maior; 3ª feira, 08/11/ 2011)
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