BBatemos no peito com orgulho por sermos os maiores exportadores de soja e minério de ferro, enquanto o mundo contemporâneo já ultrapassou há muito a microeletrônica, a informatica e a biotecnologia. E hoje caminha à velocidade da luz para pesquisas e rumos que, infelizmente, não temos a capacidade de acompanhar.
Pós-neocolonialismo?
Paulo Kliass, da Carta Maior .
Ao longo das últimas semanas, foram divulgadas algumas informações na área econômica que são bastante ilustrativas da verdadeira sinuca de bico em que se encontra metido o modelo que nossas elites insistem a implementar para o País.
A dificuldade em lidar com esse tipo de análise reside, como sempre, na esfera política. Numa primeira abordagem, os dados são ótimos, maravilhosos mesmo, dirão alguns. Lógico! Tudo entra na fatura da contabilidade do marketing, da satisfação de poderosos interesses no interior da sociedade e dos índices de popularidade de qualquer governo de plantão. Porém, ao retirarmos a primeira camada do esmalte brilhoso e resplandecente da aparência, topamos com as dificuldades próprias da essência do fenômeno. Então, vamos aos fatos.
Como informa o título do artigo, vamos discutir com base nos resultados que vieram a público a respeito de desempenho das duas maiores empresas brasileiras e do setor responsável por grande parte do dinamismo econômico que o País vem apresentando nos últimos anos. Como veremos, 2010 foi um ano que confirmou a tendência até então observada e que permite projetar a continuidade do modelo. Afinal, para usar as tão conhecidas parábolas futebolísticas do ex Presidente Lula, parece que o governo está convencido de que “não se deve mexer em timer que está ganhando”... Mesmo que tal opção signifique o comprometimento estratégico do futuro do País.
No ano passado, a Petrobras consolidou sua posição como maior empresa brasileira. E apresentou como resultado um lucro líquido de R$ 35 bilhões. Ou seja, uma elevação de 17% sobre o lucro de R$ 30 bilhões obtido em 2009. É importante registrar que tal desempenho representa o maior valor nessa rubrica jamais obtido por uma companhia de capital aberto na história brasileira. Está certo, muito bem! Excelente resultado, a empresa realmente vem ampliando seus investimentos, diversificando seus produtos e atividades. E, além de tudo, é importante lembrar que continua a ser uma empresa estatal, com a maioria das ações em mãos da União. Ou seja, mais uma vez a ladainha da ineficiência da participação do Estado da economia não se sustenta; muito pelo contrário. O ponto a salientar, porém, é que o ramo da Petrobras continua a ser o de negócios com petróleo. Entre dezembro de 2009 e dezembro de 2010, os preços dessa importante matéria-prima subiram 20% no mercado internacional. Portanto, produzir, vender e processar petróleo confirmou-se – mais uma vez - como um empreendimento bastante lucrativo nos tempos de hoje.
Durante 2010, os resultados da Vale também foram expressivos. O lucro líquido apresentado pela empresa foi de R$ 30 bilhões no período, o que representou um crescimento de 192% sobre o lucro de R$ 10 bi relativo a 2009. Trata-se do melhor resultado operacional jamais apresentado por uma empresa privada de capital aberto em nosso País. Não custa recordar que a vale era uma empresa do governo federal criada por Getúlio Vargas em 1942, antes de ser privatizada pelo ex Presidente Fernando Henrique em 1997 pela bagatela de R$ 3,3 bilhões. Ou seja, apenas nesses últimos 2 exercícios, o lucro obtido pela empresa foi equivalente a 13 vezes o seu valor de venda. Um resultado financeiro superior a 1.100%, capaz de deixar qualquer operador no mercado empresarial surpreendido e de água na boca! Apesar de também ter buscado a diversificação de suas atividades e o crescimento do grupo, a Vale continua a ser uma empresa conhecida internacionalmente por seus negócios com minério de ferro.
O marco legal e institucional de seu ramo de atividade permanece definido em nossa Constituição Federal. Em seu artigo 176, lê-se que “as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais ... constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União...” (GN). Ou seja, toda a atividade de exploração do subsolo é realizada com base em concessão efetuado pelo poder público junto às entidades do setor privado. A importância estratégica do setor no modelo atualmente existente é de tal ordem que as exportações de minério de ferro foram o principal item da pauta, com peso superior a 14% do total de nossas vendas ao exterior em 2010. Uma de suas inúmeras fragilidades, por exemplo, pode ser evidenciada na concentração de 1/3 desse total exportado para um único País, a China. Além disso, o resultado da Vale foi fortemente influenciado pela evolução dos preços do minério de ferro no mercado das chamadas “commodities”. Entre dezembro de 2009 e dezembro de 2010, esse importante produto apresentou um crescimento de 60% em seu preço!
Já os resultados do agronegócio foram também bastante rentáveis para os operadores nos diversos mercados que o compõem. As safras apresentaram números expressivos de crescimento e os valores cresceram também influenciados pelas altas dos preços das “commodities” nas bolsas internacionais de mercadorias. Em termo agregados, de acordo com informações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a safra agrícola de 2010 atingiu 150 milhões de toneladas, com um crescimento de 12% sobre o ano anterior. Vejamos a situação de alguns produtos mais expressivos para o caso brasileiro.
No caso da produção de cereais, leguminosas e oleaginosas, apenas 3 culturas concentram 91% da
A dificuldade em lidar com esse tipo de análise reside, como sempre, na esfera política. Numa primeira abordagem, os dados são ótimos, maravilhosos mesmo, dirão alguns. Lógico! Tudo entra na fatura da contabilidade do marketing, da satisfação de poderosos interesses no interior da sociedade e dos índices de popularidade de qualquer governo de plantão. Porém, ao retirarmos a primeira camada do esmalte brilhoso e resplandecente da aparência, topamos com as dificuldades próprias da essência do fenômeno. Então, vamos aos fatos.
Como informa o título do artigo, vamos discutir com base nos resultados que vieram a público a respeito de desempenho das duas maiores empresas brasileiras e do setor responsável por grande parte do dinamismo econômico que o País vem apresentando nos últimos anos. Como veremos, 2010 foi um ano que confirmou a tendência até então observada e que permite projetar a continuidade do modelo. Afinal, para usar as tão conhecidas parábolas futebolísticas do ex Presidente Lula, parece que o governo está convencido de que “não se deve mexer em timer que está ganhando”... Mesmo que tal opção signifique o comprometimento estratégico do futuro do País.
No ano passado, a Petrobras consolidou sua posição como maior empresa brasileira. E apresentou como resultado um lucro líquido de R$ 35 bilhões. Ou seja, uma elevação de 17% sobre o lucro de R$ 30 bilhões obtido em 2009. É importante registrar que tal desempenho representa o maior valor nessa rubrica jamais obtido por uma companhia de capital aberto na história brasileira. Está certo, muito bem! Excelente resultado, a empresa realmente vem ampliando seus investimentos, diversificando seus produtos e atividades. E, além de tudo, é importante lembrar que continua a ser uma empresa estatal, com a maioria das ações em mãos da União. Ou seja, mais uma vez a ladainha da ineficiência da participação do Estado da economia não se sustenta; muito pelo contrário. O ponto a salientar, porém, é que o ramo da Petrobras continua a ser o de negócios com petróleo. Entre dezembro de 2009 e dezembro de 2010, os preços dessa importante matéria-prima subiram 20% no mercado internacional. Portanto, produzir, vender e processar petróleo confirmou-se – mais uma vez - como um empreendimento bastante lucrativo nos tempos de hoje.
Durante 2010, os resultados da Vale também foram expressivos. O lucro líquido apresentado pela empresa foi de R$ 30 bilhões no período, o que representou um crescimento de 192% sobre o lucro de R$ 10 bi relativo a 2009. Trata-se do melhor resultado operacional jamais apresentado por uma empresa privada de capital aberto em nosso País. Não custa recordar que a vale era uma empresa do governo federal criada por Getúlio Vargas em 1942, antes de ser privatizada pelo ex Presidente Fernando Henrique em 1997 pela bagatela de R$ 3,3 bilhões. Ou seja, apenas nesses últimos 2 exercícios, o lucro obtido pela empresa foi equivalente a 13 vezes o seu valor de venda. Um resultado financeiro superior a 1.100%, capaz de deixar qualquer operador no mercado empresarial surpreendido e de água na boca! Apesar de também ter buscado a diversificação de suas atividades e o crescimento do grupo, a Vale continua a ser uma empresa conhecida internacionalmente por seus negócios com minério de ferro.
O marco legal e institucional de seu ramo de atividade permanece definido em nossa Constituição Federal. Em seu artigo 176, lê-se que “as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais ... constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União...” (GN). Ou seja, toda a atividade de exploração do subsolo é realizada com base em concessão efetuado pelo poder público junto às entidades do setor privado. A importância estratégica do setor no modelo atualmente existente é de tal ordem que as exportações de minério de ferro foram o principal item da pauta, com peso superior a 14% do total de nossas vendas ao exterior em 2010. Uma de suas inúmeras fragilidades, por exemplo, pode ser evidenciada na concentração de 1/3 desse total exportado para um único País, a China. Além disso, o resultado da Vale foi fortemente influenciado pela evolução dos preços do minério de ferro no mercado das chamadas “commodities”. Entre dezembro de 2009 e dezembro de 2010, esse importante produto apresentou um crescimento de 60% em seu preço!
Já os resultados do agronegócio foram também bastante rentáveis para os operadores nos diversos mercados que o compõem. As safras apresentaram números expressivos de crescimento e os valores cresceram também influenciados pelas altas dos preços das “commodities” nas bolsas internacionais de mercadorias. Em termo agregados, de acordo com informações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a safra agrícola de 2010 atingiu 150 milhões de toneladas, com um crescimento de 12% sobre o ano anterior. Vejamos a situação de alguns produtos mais expressivos para o caso brasileiro.
No caso da produção de cereais, leguminosas e oleaginosas, apenas 3 culturas concentram 91% da
produção. Em 2010, a produção de soja cresceu 20%. A produção de milho cresceu 28%. A produção de arroz caiu 10%. Mas os volumes e as áreas são de dimensões significativas:
Produto......Produção - ton..........Área - ha
Soja..........................69...........................24
Milho.........................56...........................13
Arroz.........................12.............................3
Outro ramo do agronegócio que merece destaque é o de carnes. Aqui também observou-se o estímulo governamental à consolidação de grandes conglomerados. Na área de aves e suínos foram unificados os grupos Perdigão e Sadia. Já na área de bovinos, o governo incentivou e ajudou financeiramente à criação da maior empresa mundial no setor, a partir do grupo JBS-Friboi. No caso deste último, apesar de não terem sido divulgados os resultados para 2010, as estimativas das receitas apontam para um crescimento da ordem de 50% em relação ao ano anterior.
Além disso, é importante salientar que toda essa performance exportadora tem ocorrido num ambiente de valorização cambial de nossa moeda. Imagine-se quais não teriam sido os resultados caso o real não estivesse tão artificialmente valorizado face às demais moedas estrangeiras. Na verdade, o grande motor para esse crescimento da importância desses setores primário-exportadores tem sido a elevação dos preços das commodities no mercado internacional. Aqui seguem alguns exemplos de tal crescimento observado entre dezembro de 2009 e dezembro 2010: milho - 52%; carne de boi - 36%; café - 31%; soja - 27%; açúcar - 12%.
Coerentemente com a projeção de tal cenário, as previsões do MAPA para a próxima safra a ser colhida apontam um crescimento no valor da produção da ordem de 6% (o que corresponde ao maior valor dos últimos 14 anos), além de um recorde histórico na safra de grãos.
Ora, tais informações nos confirmam que a opção estratégica pelo modelo primário exportador continua cada vez mais firme. Este se ancora politicamente nos representantes de tais interesses no Congresso e nos postos relevantes na Esplanada dos Ministérios. Ora, ninguém desconsidera a contribuição que a agropecuária e o agronegócio, de forma mais ampla, podem oferecer ao desenvolvimento nacional. Não é essa a questão. O ponto a reter é a inexistência de um modelo alternativo, de um plano de médio e longo prazos que preveja algum mecanismo de substituição desse modelo antiquado e pouco agregador de valor. Caso contrário, continuaremos “eternamente em berço esplêndido”, como tem sido a nossa tradição histórica de manter a todo o custo os pactos do atraso social, político e econômico. Ao invés de ousar, na procura do novo e do inovador para o futuro, nos resignamos a mirar no retrovisor e considerar tudo o que deixamos para trás como um grande avanço.
Atravessamos a época do colonialismo do século XIX em condições de desvantagem. Ingressamos no período do neocolonialismo do século XX também com pouca capacidade de dar um grande salto à frente com o modelo de substituição de importações. Em nenhum dos momentos conseguimos romper a lógica do ingresso na divisão internacional do trabalho com maior valor a agregar à nossa produção. A lógica da dependência e da subordinação tem imperado como uma espécie de resignação a uma maldição inescapável.
E agora, outra janela de oportunidade se abre nesse período histórico, em que países com condições semelhantes à nossa internalizam capacidade de inovar na produção e na geração de conhecimento. Mas nesse início do século XXI, parecemos ainda nos vangloriar de sermos a eterna vanguarda do atraso, ainda que com a aparência enganosa da renovação. Como se fôssemos o exemplo, por excelência, do agente subalterno na divisão de posições do cenário do pós-neocolonialismo. Em um mundo cada vez mais marcado pela multipolaridade e pela existência de espaços a ocupar com afirmação de soberania nacional, repetimos as tentativas de inserção pela via da submissão. Continuamos muito atrás da maioria dos países em termos dos índices de educação e de ciência, tecnologia e inovação nas áreas estratégicas, os setores portadores do futuro. Batemos no peito com orgulho por sermos os maiores exportadores de soja e minério de ferro, enquanto o mundo contemporâneo já ultrapassou há muito a microeletrônica, a informática e a biotecnologia. E hoje caminha à velocidade da luz para pesquisas e rumos que, infelizmente, não temos nem a capacidade de acompanhar.
Produto......Produção - ton..........Área - ha
Soja..........................69...........................24
Milho.........................56...........................13
Arroz.........................12.............................3
Outro ramo do agronegócio que merece destaque é o de carnes. Aqui também observou-se o estímulo governamental à consolidação de grandes conglomerados. Na área de aves e suínos foram unificados os grupos Perdigão e Sadia. Já na área de bovinos, o governo incentivou e ajudou financeiramente à criação da maior empresa mundial no setor, a partir do grupo JBS-Friboi. No caso deste último, apesar de não terem sido divulgados os resultados para 2010, as estimativas das receitas apontam para um crescimento da ordem de 50% em relação ao ano anterior.
Além disso, é importante salientar que toda essa performance exportadora tem ocorrido num ambiente de valorização cambial de nossa moeda. Imagine-se quais não teriam sido os resultados caso o real não estivesse tão artificialmente valorizado face às demais moedas estrangeiras. Na verdade, o grande motor para esse crescimento da importância desses setores primário-exportadores tem sido a elevação dos preços das commodities no mercado internacional. Aqui seguem alguns exemplos de tal crescimento observado entre dezembro de 2009 e dezembro 2010: milho - 52%; carne de boi - 36%; café - 31%; soja - 27%; açúcar - 12%.
Coerentemente com a projeção de tal cenário, as previsões do MAPA para a próxima safra a ser colhida apontam um crescimento no valor da produção da ordem de 6% (o que corresponde ao maior valor dos últimos 14 anos), além de um recorde histórico na safra de grãos.
Ora, tais informações nos confirmam que a opção estratégica pelo modelo primário exportador continua cada vez mais firme. Este se ancora politicamente nos representantes de tais interesses no Congresso e nos postos relevantes na Esplanada dos Ministérios. Ora, ninguém desconsidera a contribuição que a agropecuária e o agronegócio, de forma mais ampla, podem oferecer ao desenvolvimento nacional. Não é essa a questão. O ponto a reter é a inexistência de um modelo alternativo, de um plano de médio e longo prazos que preveja algum mecanismo de substituição desse modelo antiquado e pouco agregador de valor. Caso contrário, continuaremos “eternamente em berço esplêndido”, como tem sido a nossa tradição histórica de manter a todo o custo os pactos do atraso social, político e econômico. Ao invés de ousar, na procura do novo e do inovador para o futuro, nos resignamos a mirar no retrovisor e considerar tudo o que deixamos para trás como um grande avanço.
Atravessamos a época do colonialismo do século XIX em condições de desvantagem. Ingressamos no período do neocolonialismo do século XX também com pouca capacidade de dar um grande salto à frente com o modelo de substituição de importações. Em nenhum dos momentos conseguimos romper a lógica do ingresso na divisão internacional do trabalho com maior valor a agregar à nossa produção. A lógica da dependência e da subordinação tem imperado como uma espécie de resignação a uma maldição inescapável.
E agora, outra janela de oportunidade se abre nesse período histórico, em que países com condições semelhantes à nossa internalizam capacidade de inovar na produção e na geração de conhecimento. Mas nesse início do século XXI, parecemos ainda nos vangloriar de sermos a eterna vanguarda do atraso, ainda que com a aparência enganosa da renovação. Como se fôssemos o exemplo, por excelência, do agente subalterno na divisão de posições do cenário do pós-neocolonialismo. Em um mundo cada vez mais marcado pela multipolaridade e pela existência de espaços a ocupar com afirmação de soberania nacional, repetimos as tentativas de inserção pela via da submissão. Continuamos muito atrás da maioria dos países em termos dos índices de educação e de ciência, tecnologia e inovação nas áreas estratégicas, os setores portadores do futuro. Batemos no peito com orgulho por sermos os maiores exportadores de soja e minério de ferro, enquanto o mundo contemporâneo já ultrapassou há muito a microeletrônica, a informática e a biotecnologia. E hoje caminha à velocidade da luz para pesquisas e rumos que, infelizmente, não temos nem a capacidade de acompanhar.
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