247 – O empresário Abilio Diniz está causando, como diz a gíria. Causando constrangimento dentro do governo federal e, ao mesmo tempo, despertando críticas furiosas na própria base parlamentar da presidente Dilma Rousseff.
A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados aprovou hoje dois requerimentos convidando o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a participarem de audiência pública para discutir a fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour. A intenção de se fechar um negócio no setor de supermercados foi confirmada ontem pelas empresas.
Os requerimentos precisam ainda ser votados, o que deve ocorrer na próxima reunião, prevista para terça-feira, quando ocorrerá audiência pública sobre a fusão entre Sadia e Perdigão com representantes da empresa e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
À tarde, em meio à reverberação de sua proposta de criação de um conglomerado que abarcaria sob uma mesma bandeira, de uma só vez, quase 40% do setor supermercadista do País, Abilio compareceu à reunião da Câmara de Política de Gestão, Desenvolvimento e Competitividade. Parecia, para ele, cuja jogada para fundir o Pão de Açúcar com o Carrefour abalou até mesmo o movimento normal da Bolsa de Valores de São Paulo, que nada estava acontecendo. Mas estava. Em lugar de comentar a presença do empresário como algo natural no encontro que ela própria presidiu, a ministra chefe do Gabinete Civil, Gleisi Hoffmann, tratou, diante dos repórteres que cobrem o Palácio do Planalto, de afastar qualquer proximidade com Abilio. “Foi uma enorme coincidência”, resumiu. Em seguida, passou a defender o governo quanto frente à manobra do empresário. Segundo ela, o tema não foi tratado na reunião à portas fechadas da Câmara de Gestão. Para ela, a questão é de "enquadramento" e "não tem dinheiro público, nem do FGTS, nem do Tesouro". "É dinheiro do BNDESpar", afirmou.
O visível constrangimento da ministra Gleisi pela presença de Abilio em Brasília é compreensível. A proposta de fundir os dois maiores conglomerados supermercadistas do País tem, na raiz, o apoio financeiro do BNDES. O banco estatal de investimento demonstrou disposição de enfiar nada menos que “dois bilhões de euros”, conforme os termos empregados hoje em nota oficial da instituição, para ajudar o empresário em sua manobra de passar por cima da vontade de seus sócios franceses do grupo Casino. Ou melhor, viabilizarm mais que ajudar. Afinal, a quantia que o BNDES está disposto a, digamos, investir corresponde a nada menos que 85% do valor total estimado para ser entregue ao Carrefour. Em contrapartida, o banco estatal, de acordo com a proposta divulgada na sede do privado BTG Pactual, na terça, em São Paulo, ficaria com algo como 9% do novo negócio. Isso mesmo: 85% do dinheiro para 9% do resultado da compra.
“O BNDES está jogando, com esse negócio, dinheiro fora, pelo buraco”, afirmou ao 247 o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), que pertence à base de apoio do governo Dilma. “O banco tem de investir em empresas que irão gerar empresas e não, como nesse caso, num conglomerado a ser criado que irá cortar postos de trabalho”. Juntos, Pão de Açúcar e Carrefour, sob a gestão de Abilio Diniz, controlariam nada menos que 2,2 mil pontos de venda de alimentos, com atuais 214 mil funcionários. Enquanto os fornecedores temem, desde já, enfrentar esse poderia, os sindicatos receiam cortes na mão de obra. O público consumidor, por seu lado, teria menos opções para comprar, o que costuma resultar em elevação de preços. “O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) tem de vetar esse negócio, Abilio Diniz, se quiser, terá de se virar sozinho”.
Pela oposição, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) assinalou ao 247 que não existe interesse público no negócio, apenas o empresarial. “É sempre a mesma coisa. Quase setenta por cento dos recursos do BNDES são canalizados para as grandes empresas, e apenas 27,9% vão para as pequenas e médias empresas, que é onde estão os empregos que deveriam ser fomentados pelo BNDES”, disse o senador em plenário. “O ministro (da Ciência e Tecnologia) Aloizio Mercadante veio dizer aqui ontem dizer que faltam recursos para financiar ciência e tecnologia no Brasil. Esse dinheiro está sendo jogado fora”, completou.
Para tratar das manobras de Abilio Diniz, o grupo Casino, seu sócio no Pão de Açúcar e que não quer aceitar a proposta, contratou um dos melhores criminalistas do Brasil, o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, para cuidar das estripulias comerciais de Abilio. “Sinto que há um cheiro de golpe de Estado sobre a vida corporativa”, disse o advogado, hoje, ao Brasil 247. Foi uma referência velada ao movimento de apoio dado ao BNDES para o monopólio que o empresário sonha formar.
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