quarta-feira, 11 de maio de 2011

FALTA CORAGEM

Continuamos o país dos  jeitinhos. A mais recente  Assembléia Nacional Constituinte instalou-se em 1987 e   decorrido um ano e meio inexistiam sinais de estar próxima a promulgação  do texto final. Muito tempo se perdeu com os trabalhos das   Comissões Temáticas que produziam seus projetos  sem olhar para o lado, quer dizer, uma não sabia o  que a outra fazia, resultando não raro em capítulos  redundantes, senão conflitantes, até  que por decisão do relator, Bernardo Cabral, criou-se a Comissão de Sistematização, encarregada de  compatibilizar as variadas contribuições.
Mesmo assim, o processo andava a passos de tartaruga, ou em muito aspectos nem andava, dada a divisão dos constituintes em dois grupos.
De um lado os  que se intitulavam o Centro Democrático, apelidado de “centrão”, na verdade os conservadores, para não dizer os reacionários, infensos a qualquer tipo de reformas, precursores do chamado neoliberalismo.
No reverso da medalha pontificavam os ditos “progressistas”,  em grande parte ingênuos imaginando mudar o  Brasil  através de folhas de papel, iludidos de que bastava escrever milagres sociais e políticos para  eles tornarem-se realidade.
O resultado foi o impasse, pois nenhum dos lados dispunha de maioria para fazer prevalecer seus pontos de vista. O tempo ia passando e mais de cem princípios maiores permaneciam indefinidos e sem solução, como  em matéria de reformas sociais,  econômicas, monopólios, propriedade estatal  e atribuições do poder público.
Como estamos no Brasil, quem deu a solução foi o dr. Ulysses, presidente da Assembléia, mesmo  invertendo a mais lógica  das regras  do Direito Constitucional.  Porque desde que surgiram as Constituições  estabeleceu-se  deverem elas  conter as definições fundamentais, as mais importantes. A lei ordinária se encarregaria de detalhar o que a lei maior dispunha.  Por conta do confronto, o saudoso mestre determinou que ficariam para a lei ordinária os princípios onde inexistia consenso, quer dizer, a Constituição foi promulgada com vazios monumentais. Caso contrário estaríamos até hoje sem Constituição.
Um desses vazios, até hoje à vista de todos,  reside no artigo 220, da Comunicação Social. Num de seus parágrafos  lê-se que “compete à lei federal (...) estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a  possibilidade de se defenderem  de programas ou programações de rádio e de televisão que contrariem o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa  e da família.”
Pois bem. Passados 23 anos da promulgação da Constituição, onde estão esses meios legais? Em que caverna  se esconde a garantia da defesa contra o lixo que flui cada dia mais intensamente das telinhas e microfones do país?
Nenhum partido, nenhuma bancada, nenhum parlamentar dispôs-se até hoje de encontrar   mecanismos para nos defender. Nenhum governo,  já  que também cabe aos governos a iniciativa de projetos de lei.
Seria simples, caso não faltasse coragem. Nada de censura, pois em diversos artigos a Constituição a proíbe. De jeito nenhum estabelecer   restrições à liberdade. Mas por que não dispor penalidades a posteriori, quer dizer, depois da divulgação de baixarias,  de incentivos ao crime e ao tóxico, de pornografia explícita e de tanta coisa a mais, seria simples a lei determinar admoestações públicas, multas, suspensão de concessões e até cassação  das próprias. 
Por que até hoje nada se fez? Porque tanto os governos quanto deputados e senadores temem desagradar os barões televisivos. Morrem de medo se, como represália, sofrerem campanhas por parte dos meios de comunicação. Ou, mesmo, se forem  banidos do  noticiário, ante-sala do fim de suas carreiras políticas.  Tanto pior para a pessoa e para a família...

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