quinta-feira, 11 de agosto de 2011

ALEXANDRE HOHAGEN
Tapa na cara ou soco no estômago?



Há, sim, disposição dos brasileiros em reagir, e a internet proporciona ferramentas eficazes

AMO O Brasil. E já comentei em outra coluna que não sou do tipo que chega nos aeroportos e começa a reclamar da fila, da esteira, do controle de passaporte. Estou certo de que o "imagina isso aqui na Copa" não ajuda a mudar a situação.
Mas nada tem me deixado mais atento do que o editorial da primeira semana de julho do jornal espanhol "El País". Nele, com uma frieza cruel de quem pergunta o que ninguém quer ouvir, o jornalista Juan Arias dispara: "Por que os brasileiros não reagem perante a corrupção de seus políticos".
O artigo, que foi traduzido e publicado em alguns jornais, gerou diversas reações na mídia tradicional e na blogosfera. Alguns ressaltaram a relevância do texto e a verdade cruel a que ele se presta. Outros tantos metralharam o espanhol com lições de história, paralelos com a matança das civilizações pré-colombianas e obviamente com comparações entre a situação atual das economias brasileira e espanhola.
Mas, leitor, ponha de lado qualquer juízo de valor e esqueça que o texto foi publicado por um estrangeiro, que deveria estar preocupado com seu quintal madrilenho.
A verdade é uma: o editorial doeu mesmo! Só que não como deveria ter doído. Não como um tapa na cara. Inesperado, rápido, dolorido, de fácil recuperação. Mais de um mês após sua publicação e uma onda interminável de notícias sobre outros casos de corrupção, estou achando que o artigo do espanhol está mais com jeito de soco no estômago. Pesado, de alto impacto, tira o ar, imobiliza qualquer reação.
Como brasileiro, me pergunto: como fazer do editorial espanhol um tapa na cara e não um soco no estômago?
O próprio Arias observa a disposição e a energia que há entre o povo brasileiro, que mobiliza milhões de pessoas nas passeatas na avenida Paulista. Nos outros tantos milhares de pessoas que desfilam próximo ao Campo de Marte, na zona norte paulistana, para demonstrar a fé em sua religião. E ainda nas demonstrações de repúdio à violência, como temos visto na orla carioca.
Não é certo dizer que falta disposição para mobilizar. Ainda mais agora, com o crescimento acelerado das redes sociais. Os brasileiros, principalmente os jovens, aprenderam a levantar a voz e a mobilizar milhares de pessoas para protestar contra temas que não concordam.
Lembra da convocação no Facebook para o churrasco de gente diferenciada? Uma simples mensagem foi capaz de amealhar dezenas de milhares de pessoas para protestar contra a mudança de uma estação do metrô no bairro de Higienópolis. E do protesto a favor da amamentação em locais públicos? E na mobilização para conferir a soma nas contas de restaurantes?
Ou seja, há sim disposição dos brasileiros em reagir. E a internet proporciona ferramentas eficazes, capazes de dar voz a milhares de pessoas. Além da disposição das pessoas e de um país que adota rapidamente novas tecnologias, o Brasil despertou o interesse de movimentos de combate à corrupção.
Veja o exemplo do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral). Esse movimento foi quem propôs a Lei da Ficha Limpa. Infelizmente, os efeitos dessa lei foram suspensos nas eleições do ano passado. As consequências estão estampadas diariamente nas manchetes dos jornais.
Nesta semana li: "Sem Ficha Limpa, deputado de Alagoas acusado de três mortes volta ao cargo".
Mais um soco no estômago? Não! É preciso reagir. Acredito muito que, nos tempos atuais, a mobilização pacífica da sociedade depende de vontade própria, de tecnologias eficazes e de um empurrão de movimentos organizados.
Está tudo aí: vontade da sociedade, tecnologias, redes sociais e entidades organizadas. É hora de levantar a mão e expressar pacificamente o desacordo para um mal que ainda abala nossa imagem. No próprio Facebook já começo a ler alguns comentários. No entanto, é preciso fazer mais por nossa sociedade. E dar voz àquilo de que discordamos é papel de cada um de nós.
Nas palavras de outro colunista desta Folha, Fábio Barbosa: "Temos de deixar um mundo melhor para os nossos filhos, e filhos melhores para o nosso mundo".

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