sábado, 22 de maio de 2010

ACREDITAR.

Empresa abre porta de saída do Bolsa Família.
Parceria entre a construtora Odebrecht e o governo federal já treinou 8,3 mil beneficiários do programa de transferência de renda.
Panorama da construção da usina hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira: porta de saída para o Bolsa Família.
PORTAL iG - Gustavo Poloni, enviado especial a Porto Velho-RO
Foto: Gleice Mere
Em outubro do ano passado, Laudinéia Queiroz matriculou-se no Acreditar, programa de capacitação profissional da construtora Odebrecht. Depois de quatro meses desempregada, queria trabalhar como zeladora na construção da usina de Santo Antônio, no rio Madeira, em Porto Velho. Aos 30 anos, a ex-doméstica se formou e disputou a vaga com 40 candidatos. Para ganhar o emprego, valeu-se de um diferencial inusitado: uma carteirinha do Bolsa Família. A vantagem de Laudinéia no processo seletivo surgiu de um acordo assinado no início do ano passado entre a Odebrecht e o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). De acordo com ele, os beneficiários do programa de transferência de renda têm prioridade para fazer matrícula em cursos profissionalizantes e na contratação de novos funcionários. Pouco mais de um ano depois de entrar em vigor, a parceria foi levada para nove obras da Odebrecht e já formou mais de 8,3 mil beneficiários do Bolsa Família, sendo que mil deles foram contratados pela construtora. Agora, o governo federal quer usar o projeto como modelo a ser replicado em outras empresas, como a Vale e a CSN. “A iniciativa é boa”, disse Marcelo Neri, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Alguns chamam de porta de saída do Bolsa Família, mas prefiro falar em porta de entrada para o mercado de trabalho”.
Laudinéia não é a única funcionária da construção da usina de Santo Antônio a usar o Bolsa Família para entrar no mercado de trabalho. Das 28 mil pessoas que passaram pelo Acreditar em Porto Velho, cerca de 10% recebem algum tipo de complemento de renda do governo federal. Destes, 545 foram contratados. Apesar de representar apenas 5% do total dos funcionários da obra, a contratação acarreta numa mudança radical na vida dessas pessoas. Laudinéia é uma delas. Há cinco anos, recorreu ao Bolsa Família para complementar os R$ 700 que o marido ganhava como instalador de outdoor nas ruas de Porto Velho. O dinheiro do bico não era suficiente para colocar comida na mesa, comprar roupas para a família e pagar a educação dos três filhos. O benefício de R$ 130 ajudou a melhorar as coisas, mas não era suficiente. “Foi um período difícil”, afirmou. Desde que foi contratada para trabalhar na obra, em janeiro, a zeladora não depende mais do benefício. Além do salário de R$ 888, Laudinéia tem plano de saúde e ganha uma cesta básica da empresa. Com o dinheiro extra, quer reformar a casa de apenas um quarto e garantir uma educação melhor para os filhos. “Meu benefício já pode ser usado por outra pessoa mais necessitada”, disse. Acreditar - Usina de Santo Antônio.
Obra da usina de Santo Antônio, no rio Madeira: 5% dos 10 mil funcionários saíram do programa de transferência de renda.
EM TEMPO; É óbvio haver “portas de saída”, principalmente se forem como essa – uma oportunidade real, e não simplesmente um pé no traseiro. Creio, no entanto, que programas como o Bolsa Família vieram para ficar. Não dá para ler o capitalismo contemporâneo a partir do conflito entre capital e trabalho. Quem tem trabalho está muito bem, obrigado – é o caso de dona Laudinéia. Como não temos mais perspectiva de ruptura (passagem revolucionária para uma organização social e econômica de outro tipo), a tarefa é administrar o capitalismo da melhor forma, recorrendo pesadamente a políticas de transferência direta de renda, como o Bolsa Família. Foi basicamente isso que o PSDB não conseguiu ver, e por isso foi atropelado pelo PT.

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