domingo, 29 de agosto de 2010

A MÚSICA AFRICANA É COMO A AMAZÔNIA

Natalia da Luz, JB Online
Carlinhos Brown diz que música africana é como Amazônia: nunca acabará.
As maiores influências africanas presentes no Brasil estão na Bahia. O estado é uma das regiões mais importantes para a nossa produção musical, onde Carlinhos Brown surge como o ícone dessa representação, como o grande entuasta da conexão Brasil-África. A paixão por suas raízes está estampada neste artista, que nos recepciona com saudações de orixás. "A música africana nasceu como base estética das músicas do mundo. Ela continua livre, pura e foi a principal chave para a popularização da música americana e brasileira", disse em entrevista ao JB, após o show de abertura do festival de cultura africana Back2Black, na Estação Leopoldina.
Para explicar a penetração dessa música, ele cita a influência da Diáspora Africana (deslocamento de parte da população originária da África para outros continentes, especialmente América). O movimento criado principalmente por escravos e seus descendentes propagou a cultura africana pelo mundo e pelo Brasil, que foi principal destino, acolhendo o maior número de escravos. "A Diáspora ajudou a criar várias levadas, performances. Eu sou baiano e tenho origem no candomblé de Angola. O que chamamos de funk carioca, nada mais é do que uma batida de congo", compara, estimulando a reflexão sobre o contemporâneo que reinventa o tradicional.
"Quando falamos dessas origens e dos orixás, lembramos que os orixás não têm bíblia. É uma cultura oral que nos abençoou até o dia de hoje", conta o músico, pesquisador, compositor e percussionista internacionalmente elogiado. Com paixão e know how de quem não apenas estuda, mas é considerado como um legado africano em nosso país, ele leva para os palcos a língua dos orixás. "Eles fizeram a lingua-mãe para conduzir as outras do mundo. A música africana está em Sinatra, Beyoncé, Rihana, Ivete, em mim, no Jorge Ben, no Seun Kuti (artista nigeriano com o qual também conversamos), no Fela Kuti (pai dele e criador do Afrobeat). O que é de Deus é do povo, sem distinção. Está em todos nós", completou em tom poético.
Brown preserva o tradicional e também reverencia o moderno, que estimula novas derivações da música africana, sucesso na Europa. "Acompanhei esse movimento desde a década de 80. Gravei e aprendi muito com os maiores expoentes da música africana na Europa. O Fela foi um deles. Ver isso ganhando proporções maiores é muito bom", conta em relação à popularização da manifestação cultural nascida na África, acessível em todo o mundo. Apesar de ter encontrado espaço no mainstream, o brasileiro ressalta que a música africana está em um nível muito alto de sofisticação. "O público acompanha mais a música africana POP, mas ela tem a sua vertente de raiz, do traditional que é preciso parar para ouvir, sobretudo nos aspectos dos sons e de seus instrumentos mais primitivos".
O intercâmbio com artistas africanos faz de Brown um porta-voz dessa influência no Brasil. Ele lembra que para os grandes de lá, um pedacinho do nosso território é considerado o local que mais preserva as bases rítmicas africanas em todo o mundo.
"E onde está a Bahia? No Brasil! Mas não é apenas lá que temos África... Se você fizer um tour pelo Rio de Janeiro, Bahia, Maranhão, Recife... Tudo isso é um caldeirão fervendo que a África deixou temperando para que essa base fosse devolvida e se espalhasse pelo mundo. A música africana é como a Amazônia. Nunca vai acabar".

Nenhum comentário: