Por Carlos Chagas
Seria oportuno que Dilma Rousseff e José Serra dessem uma olhada para fora, preparando-se para os efeitos da segunda etapa da crise já avançada na Europa, prestes a cruzar o Atlântico. Ela coincidirá com a posse do novo governo, encerrando o período de euforia um tanto fictícia dos dois mandatos do presidente Lula.
França, Grécia, Portugal, Espanha, Inglaterra e Alemanha, entre outros, defrontam-se com o que suas elites denominam de necessidade de evitar a bancarrota através do equilíbrio entre receita e despesa. Mais uma vez, guardadas as peculiaridades de cada nação, coincidem todas na solução anacrônica e perversa do sacrifício das massas assalariadas. Numa palavra, a supressão de direitos sociais conquistados a duras penas. A conta será enviada para onde sempre foi, ou seja, os ombros dos menos favorecidos. No Velho Mundo, os especuladores multiplicaram seus ganhos, os banqueiros locupletaram-se com a poupança popular, os investidores criaram ilusões e os governos acobertaram a lambança.
Agora, impõem restrições às aposentadorias, dispensas em massa no serviço público, desemprego nas atividades privadas, redução nos salários, aumento de taxas e impostos, limitação de benefícios trabalhistas, enxugamento da máquina administrativa, corte de gastos e de investimentos públicos, aviltamento da moeda e toda a tradicional receita imposta goela abaixo dos mesmos de sempre.
As imagens transmitidas pelas telinhas variam apenas na intensidade das forças policiais baixando o cassetete e arremessando bombas de gás lacrimogêneo nas praças, avenidas e esquinas de suas capitais e principais cidades. As greves são tidas como subversão explícita ao tempo em que a autoridade pública sustenta não haver outra saída.
Concluirão pelo sacrifício dos outros aqueles sempre preparados para preservar suas benesses, prontos para participar até o último momento da farra de seus privilégios. Depois, que os governos se disponham a socorrê-los, ainda que às custas da maioria.
O problema é que com a nova onda de convulsão econômica à vista, graças à mídia eletrônica desta vez também vem chegando até nós as manifestações de protesto, capazes de pegar feito sarampo.
Na hipótese da vitória de Dilma Rousseff, ficará difícil ao seu governo explicar como exigir medidas de contenção e sacrifício depois de tão prolongada euforia lulista. Mesmo prevendo-se que continue imposta a mordaça aos movimentos sindicais, a classe média se insurgirá. No improvável reverso da medalha, isto é, com a eleição de José Serra, será impossível evitar a rebelião das massas frustradas por oito anos de ilusões.
Em suma, quem vier a tornar-se presidente da República deve estar preparado para enfrentar de imediato a segunda rodada da crise que falsamente fomos os últimos a sentir e os primeiros a cair fora. Como? Ora, adotando as mesmas fórmulas do modelo aplicado há séculos, de levar a população a pagar pelo desatino das elites. Pode ser que desta vez não dê certo.
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