domingo, 15 de agosto de 2010

UNI, DUNI, TÊ

FERNANDA TORRES
Opiniões opostas, mas plausíveis, me dão vontade de escolher na sorte.
TENHO DIVERSOS amigos bem informados, com nível de escolaridade altíssimo, capacidade intelectual de dar inveja, mas totalmente discordantes quanto às próximas eleições.
Descartados os conceitos superficiais, como o de que Dilma não é simpática e Serra é mandão, e perdida entre opiniões que prezo imensamente, pedi que dois deles, o sr. F e a sra. N, me explicassem o porquê de seu horror a qualquer outra escolha que não seja a sua.
O sr. F sempre votou no PT e diz que Lula se saiu muito melhor do que ele mesmo esperava. Gerou mais empregos que FHC, aumentou o poder de compra dos necessitados, tirou mais brasileiros da miséria, reforçou as reservas cambiais e o crédito, diminuiu o risco Brasil, o valor do dólar, da taxa de juros e da inflação.
Tais conquistas confirmam, na visão do sr. F, a posição do PT como um partido mais à esquerda em relação ao PSDB, focado no fortalecimento do Estado como agente regulador do mercado em uma sociedade democrática, livre e em prol das minorias.
O sr. F afirma que Lula enfrentou uma oposição declarada da imprensa sem jamais censurá-la e considera as tentativas de regulamentação da mídia compatíveis com as existentes em outras sociedade avançadas.
Apesar do apoio de políticos como Collor e Renan Calheiros, o sr. F argumenta que Dilma tem ao seu lado um partido, o PMDB, com uma diversidade ideológica maior do que a direita convicta reinante no DEM, em parte do PMDB, no PTB e no PPS, aliados de José Serra.
Para ele, comparado com Roberto Jefferson, José Sarney mais parece Che Guevara. O sr. F reconhece o talento administrativo de Serra, mas rebate a ideia de que Dilma não tem experiência, já que foi secretária de Estado, ministra de Minas e Energia e da Casa Civil.
Já a sra. N está convencida de que Serra é o candidato mais preparado pelos cargos que já ocupou e ocupa, por sua passagem irretocável na área da saúde, pelo respeito que tem à democracia, dentro e fora do país, pela defesa da liberdade de imprensa, a aversão a patrulhas ideológicas e a crença na educação como capital humano de um país. Dilma, aos seus olhos, é um produto de marketing que jamais recebeu um voto.
Talvez a crítica mais contundente que a sra. N faça à gestão do PT seja o que chama de privatização das empresas públicas aos partidos políticos, e cita a má administração da Petrobras como exemplo. Para ela, o loteamento político das agências reguladoras do Estado brasileiro, numa prática onde os cargos são distribuídos seguindo o critério da barganha eleitoral, e não do conhecimento real da função a ser exercida, é o que de mais nocivo existe no governo atual.
A crise dos portos e a dos aeroportos seria a prova concreta da gravidade desse costume.
Ao contrário do sr. F, a sra. N acredita, sim, que existe um projeto de controle da liberdade de expressão no Brasil e que ele se agravará com a perpetuação do PT no governo.
São visões tão opostas, plausíveis e contundentes que, às vezes, aqui da minha posição extremo murista, me dá vontade de escolher no Uni, Duni, Tê.
Em dois pontos o sr. F e a sra. N concordam. O primeiro é que, apesar das bandeiras de Marina serem relevantes, sua ligação com uma igreja moralmente tão retrógrada e com um poder crescente no Brasil os afasta da vontade de apoiá-la; o segundo é que temos de acender uma vela forte e rezar pela saúde dos dois candidatos. Acabar na mão de qualquer um dos vices é uma perspectiva, no mínimo, apavorante.

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