PASQUALE CIPRO NETO
Para fazer referência a lugares que pouco frequentam o nosso dia a dia, é melhor não arriscar...
E NÃO É QUE algumas das muitas eternas ditaduras do mundo árabe começam a... Eu adoraria dizer "começam a cair", mas não é bem esse o caso. Por ora a coisa parece estar mais para a troca de seis por meia dúzia, mas, bem ou mal, já é um começo. É sempre muito difícil (ou impossível) mudar sistemas, mentes e, sobretudo, almas petrificadas.
Os espetaculares movimentos no mundo árabe levaram a imprensa para lá -nossos jornalistas também estão no "front". Os de rádio e TV muitas vezes precisam entrar ao vivo e aí... E aí de vez em quando o bicho pega. Não é fácil, por exemplo, ter de dizer, de bate-pronto, o gentílico da Tunísia ou do Iêmen. Dia desses, um querido e experiente jornalista empregou a forma "tunísios" (ou terá sido "tuníseos"?) para se referir aos habitantes da Tunísia.
Ninguém registra "tunísio". "Tuníseo" aparece no "Houaiss" como "relativo a Tunes (atual Túnis)".
Em tempos de grande ignorância geográfica (mundial, diga-se -a imprensa europeia, por exemplo, insiste em achar que o México fica na América Central ou que "carioca" é sinônimo de "brasileiro"; a brasileira acha que "portenho" é qualquer argentino), nomes como Túnis ou Tunísia, Suíça ou Suécia para muita gente soam como equivalentes.
Convém dizer logo que: a) Túnis é a capital da Tunísia; b) o gentílico de Tunísia é "tunisiano"; c) o de Túnis é "tunisino" (ou "tunesino").
Diz o "Houaiss" que no passado "Tunes" (depois "Túnis") se referia à cidade e ao país; a distinção entre o nome nacional e o nome urbano se deu no século 20. Como se vê, a raiz da confusão no emprego desses gentílicos vem de longe...
O fato é que usamos com alguma firmeza apenas os gentílicos mais conhecidos ou mais comuns. Para fazer referência a lugares que pouco frequentam o nosso dia a dia, é melhor não arriscar... Para isso existem as velhas e boas locuções adjetivas. Que tal, pois, dizer "o povo/os habitantes da Tunísia", por exemplo?
Quando usados com segurança, os gentílicos "exóticos" podem ser interessantes. Quer um bom exemplo? Lá vai: "ludovicense", um dos gentílicos da bela São Luís (o outro é "são-luisense", forma que, garantem os ludovicenses que conheço, é pouco usada na capital do Maranhão). O adjetivo "ludovicense" vem de "Ludovico", que, por sua vez, vem do alemão e se transformou em "Louis" (francês), Luís (português) etc. Aliás, como é mesmo o prenome do grande Beethoven?
Situação análoga à de "ludovicense" se dá com os gentílicos de Salvador ("salvadorense" e "soteropolitano"). O erudito (usado por muitos em Salvador) é "soteropolitano", derivado de "Soterópolis", que o "Aurélio" define como "helenização do nome da cidade de Salvador" ("helenização" é o "ato de helenizar", ou seja, "dar caráter grego").
Se você estranhou o sentido de "helenizar", lembro-lhe a letra de "Mulheres de Atenas", de Augusto Boal (sim, de Boal -a melodia é de Chico Buarque): "Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas / Despem-se pros maridos, bravos guerreiros de Atenas / Quando eles se entopem de vinho / Costumam buscar o carinho / De outras falenas / Mas no fim da noite, aos pedaços / Quase sempre voltam pros braços / De suas pequenas / Helenas".
Por trás de muitos gentílicos "estranhos", quase sempre há uma volta ao latim ou ao grego. No Rio de Janeiro, há um famoso e frequentadíssimo bar cujo nome é "Bracarense". O que significa "bracarense"? Trata-se do gentílico de Braga, pequena e bela cidade do norte de Portugal (em latim, Braga é "Bracara"). Quem não gosta de "bracarense" pode usar "brácaro" ou (ufa!) "braguês" (ou "de Braga" mesmo). É isso.
Para fazer referência a lugares que pouco frequentam o nosso dia a dia, é melhor não arriscar...
E NÃO É QUE algumas das muitas eternas ditaduras do mundo árabe começam a... Eu adoraria dizer "começam a cair", mas não é bem esse o caso. Por ora a coisa parece estar mais para a troca de seis por meia dúzia, mas, bem ou mal, já é um começo. É sempre muito difícil (ou impossível) mudar sistemas, mentes e, sobretudo, almas petrificadas.
Os espetaculares movimentos no mundo árabe levaram a imprensa para lá -nossos jornalistas também estão no "front". Os de rádio e TV muitas vezes precisam entrar ao vivo e aí... E aí de vez em quando o bicho pega. Não é fácil, por exemplo, ter de dizer, de bate-pronto, o gentílico da Tunísia ou do Iêmen. Dia desses, um querido e experiente jornalista empregou a forma "tunísios" (ou terá sido "tuníseos"?) para se referir aos habitantes da Tunísia.
Ninguém registra "tunísio". "Tuníseo" aparece no "Houaiss" como "relativo a Tunes (atual Túnis)".
Em tempos de grande ignorância geográfica (mundial, diga-se -a imprensa europeia, por exemplo, insiste em achar que o México fica na América Central ou que "carioca" é sinônimo de "brasileiro"; a brasileira acha que "portenho" é qualquer argentino), nomes como Túnis ou Tunísia, Suíça ou Suécia para muita gente soam como equivalentes.
Convém dizer logo que: a) Túnis é a capital da Tunísia; b) o gentílico de Tunísia é "tunisiano"; c) o de Túnis é "tunisino" (ou "tunesino").
Diz o "Houaiss" que no passado "Tunes" (depois "Túnis") se referia à cidade e ao país; a distinção entre o nome nacional e o nome urbano se deu no século 20. Como se vê, a raiz da confusão no emprego desses gentílicos vem de longe...
O fato é que usamos com alguma firmeza apenas os gentílicos mais conhecidos ou mais comuns. Para fazer referência a lugares que pouco frequentam o nosso dia a dia, é melhor não arriscar... Para isso existem as velhas e boas locuções adjetivas. Que tal, pois, dizer "o povo/os habitantes da Tunísia", por exemplo?
Quando usados com segurança, os gentílicos "exóticos" podem ser interessantes. Quer um bom exemplo? Lá vai: "ludovicense", um dos gentílicos da bela São Luís (o outro é "são-luisense", forma que, garantem os ludovicenses que conheço, é pouco usada na capital do Maranhão). O adjetivo "ludovicense" vem de "Ludovico", que, por sua vez, vem do alemão e se transformou em "Louis" (francês), Luís (português) etc. Aliás, como é mesmo o prenome do grande Beethoven?
Situação análoga à de "ludovicense" se dá com os gentílicos de Salvador ("salvadorense" e "soteropolitano"). O erudito (usado por muitos em Salvador) é "soteropolitano", derivado de "Soterópolis", que o "Aurélio" define como "helenização do nome da cidade de Salvador" ("helenização" é o "ato de helenizar", ou seja, "dar caráter grego").
Se você estranhou o sentido de "helenizar", lembro-lhe a letra de "Mulheres de Atenas", de Augusto Boal (sim, de Boal -a melodia é de Chico Buarque): "Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas / Despem-se pros maridos, bravos guerreiros de Atenas / Quando eles se entopem de vinho / Costumam buscar o carinho / De outras falenas / Mas no fim da noite, aos pedaços / Quase sempre voltam pros braços / De suas pequenas / Helenas".
Por trás de muitos gentílicos "estranhos", quase sempre há uma volta ao latim ou ao grego. No Rio de Janeiro, há um famoso e frequentadíssimo bar cujo nome é "Bracarense". O que significa "bracarense"? Trata-se do gentílico de Braga, pequena e bela cidade do norte de Portugal (em latim, Braga é "Bracara"). Quem não gosta de "bracarense" pode usar "brácaro" ou (ufa!) "braguês" (ou "de Braga" mesmo). É isso.
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