Editorial, Jornal do Brasil
A força precisa de solidariedade.
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. A famosa frase cunhada por Euclides da Cunha, embora descrevesse especificamente o homem do sertão, tornou-se ao longo do tempo um lema da resistência do nordestino, em sentido amplo, seja do litoral, da Zona da Mata ou das paisagens áridas da caatinga. É um atestado de força que vive sendo posto à prova, contra tudo e contra todos. Contra as desigualdades econômicas regionais brasileiras, contra a má distribuição de renda na própria composição de classes do Nordeste – onde, em muitos lugares, os estratos médios ainda são rarefeitos, reproduzindo uma arcaica estrutura oligárquica, colonial –, contra a geografia, o sol inclemente, o solo seco.
Tudo considerado, houve quem dissesse, em outra máxima lapidar, que “o problema do Nordeste não é a seca, é a cerca”, como fez Celso Furtado, há mais de 50 anos, em referência ao coronelismo, ao latifúndio, ao modelo econômico e político baseado em grandes propriedades de terras. O fato, porém, é que não bastassem os problemas estruturais, o nordestino precisa, continuamente, encontrar forças para enfrentar e domar a natureza.
A região castigada pela escassez de chuvas vê, agora, ironicamente, dois de seus estados arrasados pelo excesso delas. A enxurrada que cai em Alagoas e Pernambuco desde a última quinta-feira já causou um raro rastro de destruição: 123 mil estão desabrigados, 44 mortes foram confirmadas e mais de 600 pessoas estão desaparecidas.
É uma tragédia de proporções maiores que as do temporal que atingiu o Rio de Janeiro, em abril. Mas o cenário é ainda mais desolador e pode ser comparado, em certas cidades, ao terremoto que destruiu o Haiti, no início do ano. Há algumas razões comuns: em locais de pouca infraestrutura, o estrago gerado pela fúria da natureza é potencializado. A força da água arrasou tubulações, derrubou muros, casas, postes, pontes, com uma facilidade impressionante. Grande parte da população está sem água, comida, luz e telefone. Como no miserável país do Caribe, os dias seguintes ainda não permitem a reconstrução e a ajuda adequadas. Uma caixa de Pandora parece que foi aberta. O mau cheiro espalha-se e torna o ar irrespirável, obrigando ao uso de máscaras. Os saques proliferam. E até hospitais estão debaixo d'água.
Menos mal que o governo federal tem atuado com a urgência que a situação exige. Uma força-tarefa interministerial, reunindo 11 pastas, foi formada, possibilitando o envio de homens e equipamentos. A liberação de R$ 100 milhões, metade imediatamente, é um alento para as vítimas. Cestas básicas estão sendo distribuídas. A expertise do Exército no terremoto do Haiti tem sido aproveitada. E, para contribuir, a tragédia ainda não foi politizada. Nem deve. É hora de unir esforços. Nesta hora, o nordestino precisa, acima de tudo, de solidariedade.
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