sábado, 26 de junho de 2010

O NORDESTE É NOSSO HAITI

Editorial, Jornal do Brasil
Na ocasião em que as cenas dantescas do terremoto no Caribe invadiram as casas de milhões de brasileiros, o drama infundiu um sentimento generalizado de atuar rapidamente e dar um basta à miséria permanente. O Brasil, como o líder da força de estabilização da ONU, a Minustah, tomou para si a tarefa de organizar não só o socorro como os pilares da reconstrução. Vendo as imagens aéreas ao longo do Rio Mundaú e de outros, urge que o governo federal também atue aqui não mais com o escopo de enchentes cíclicas mas sobre uma tragédia social, ambiental e econômica de grandes proporções e de extensa durabilidade. Já são mais soldados atuando nas áreas atingidas do que no contingente da Minustah antes do sismo, e isso é bom. Melhor ainda será quando o contingente se aproximar do acionado depois do desastre. A garantia presidencial está dada.
É importante olhar para o quadro como o de uma terra arrasada. Reconstruir cidades vai exigir esforço técnico e de administração pública coordenados, blindados de discussões partidárias. Buscar responsabilidades pelas mortes, a esse nível de desintegração do tecido social, é uma perda de tempo. A urgência é, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz, “achar terra para construir longe do rio”. A inspiração em ações de vulto como o Plano Marshall – criado pelos EUA para reerguer o Japão das ruínas no pós-guerra – pode ajudar a desenvolver um projeto que congregue não apenas o estado mas a iniciativa privada. As grandes empresas têm a obrigação de auxiliar a aqueles que, diuturnamente, os ajudam a manter a liderança nos mercados em que atuam. Exemplos como o da Vale são importantes pela rapidez de reação e disponibilidade e o Jornal do Brasil se propõe a ser o canal de divulgação dessa causa tão nobre.
Responsabilidade social é saber a hora em que o braço que produz a riqueza necessita do suporte. O cortador da cana que abastece os carros a etanol não tem o que comer, vestir ou onde viver. Essa dívida é de todos. Localidades como Quebrangulo, Rio Largo, Branquinha e outras serão reconstruídas do zero. Vai ser importante desapropriar terras, e quem conhece o Nordeste sabe que oligarquias ainda detêm o controle da maior parte, sobretudo nas regiões de plantio de cana. Em algumas, o canavial das usinas faz limite com o muro da última casa. Se a vila já não podia crescer, que dirá ser realocada. Como o presidente alertou, a desapropriação não pode ser um bom negócio, alimentar a especulação, mas uma ação em nome do interesse maior. Sem lucro.
Para a economia local andar, a boa vontade tem de ser a moeda. Dívidas precisam ser anuladas, contas abonadas, prestações quitadas. Não se pode cobrar pelo que a água levou. Mantimentos, água, remédios, roupas e material de construção devem ser desonerados de impostos se comprados para o resgate dessas vidas. Só assim essa nova sociedade terá condições de se recuperar do trauma. E o resto do país de olhar para si com orgulho.

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