FERNANDA TORRES
Não basta só ser; é preciso parecer ser o candidato que os outros esperam.
DESDE QUE o sisudo Richard Nixon perdeu as eleições para a boniteza, firmeza e simpatia de John Kennedy nas eleições americanas de 1961 que não basta apenas ser, é preciso parecer ser o candidato que os outros esperam que você seja.
Nesse sentido, é de tirar o chapéu a maneira obstinada com que Dilma Rousseff encarou suas imperfeições. Não deve ter sido fácil.
Lhe tiraram os óculos, lhe arrancaram as roupas e carregaram na sua maquiagem; exigiram que aprendesse a sorrir e a quase não se irritar.
As rugas? Suavizaram-nas com bisturi. Como se não bastasse, perdeu e recuperou corajosamente o cabelo em público durante o tratamento para cura de um câncer. Encarou o medo, a vergonha e o ridículo da exposição como quem avança com um pelotão de infantaria para a linha do inimigo.
Quando parecia que a obra já estava terminada, vieram-lhe ainda com outro cabelo, deixando no ar a dúvida de se agora, com seus índices subindo nas pesquisas, o PT Pigmaleão se dará por satisfeito com sua Galatea.
Se depender de um correligionário entusiasmado que vi bradando outro dia no jornal -"A Dilma está linda! Linda!" -, não há mais como superar a perfeição.
O rosto severo de ministra, hoje, lembra uma foto de época, tão antiga quanto a de sua carteira de identidade no tempo da ditadura militar. A insegurança também está ficando pra trás.
Experimentos neurológicos demonstram que um sorriso artificial é capaz de detonar uma real sensação de felicidade no cérebro. Uma carranca infeliz também pode trazer depressão.
Quando, em 2002, Duda Mendonça criou o Lulinha Paz e Amor, talvez não tivesse consciência do quanto o personagem se apropriaria do dono.
Estive com Lula durante um encontro com artistas para que apoiassem a sua campanha na disputa com Fernando Collor. Lula sempre foi carismático, mas parecia fechado, revoltado.
Anos mais tarde, logo após a sua eleição, fui apresentar o filme "Redentor" no Palácio da Alvorada. É claro que o presidente estava feliz, aliviado, vencedor, e é lógico que todos esses sentimentos agiam sobre seu rosto.
Mas o que impressionava era que Lula estava bonito, lindo mesmo. A autoestima ajudava para o fato, mas também um bem realizado trato burguês: da pele lisa e viçosa ao terno bem cortado, dos cabelos aparados ao tratamento dentário. Lula estava gato, e continua até hoje.
Acredito que os artifícios usados em Dilma já estejam agindo sobre o interior da ex-guerrilheira. Me pergunto o que sente ao se olhar no espelho, se gosta e se se reconhece no que vê.
Penso também no que pensaria a ex-militante de si mesma hoje; se compreenderia aos 20 a mulher na qual se transformou aos 60.
Todo jovem acredita que a divisão entre o que é verdadeiro e falso é uma linha bem definida. Com a idade, a gente descobre que essa fronteira é bem ampla.
A Dilma de antes acreditava na revolução armada, a de agora entende e aceita a tortura fascista do salto alto. É o sinal dos tempos. A democracia midiática no lugar da revolução vermelha. A gente não sabe nada mesmo a respeito do porvir.
Serra talvez tenha corrigido os dentes, como eu e a maioria das pessoas que conheço, e suavizado as bolsas debaixo dos olhos em recentes candidaturas.
Mas, para estar à altura da revolução estética realizada pela sua mais importante adversária, teria que tomar medidas drásticas, não sei, talvez implantar uma vasta cabeleira ruiva e chamar a Gisele Bündchen para ser vice de sua chapa.
Já Marina é tão Marina que até alergia a maquiagem ela tem.
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