Por Kenndy Alencar
A mais recente conversa da presidente Dilma Rousseff com jornalistas da mídia impressa trouxe boas e más notícias para o país. A principal delas foi a opção clara pela manutenção do crescimento da economia num patamar relevante para o padrão histórico recente do Brasil, mas à custa de conviver com uma inflação também alta, o que traz riscos. Segue uma leitura dos principais pontos:
Economia.
A presidente desistiu de trazer a inflação para um nível menor do que 4,5% ao ano, plano que elaborou reservadamente na campanha presidencial do ano passado. Nos últimos anos, o Brasil tem tido dificuldade para chegar a 4,5%, número que é o centro da meta de inflação, de acordo com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). Essa meta tem um intervalo de tolerância de dois pontos percentuais para mais e de dois pontos para menos. O governo Dilma optou por viver bem no alto da margem superior.
"Não queremos inflação sob controle com crescimento zero", disse a presidente. "Estamos fazendo o chamado pouso suave, com uma taxa de crescimento e de emprego adequadas", afirmou.
Ora, um controle mais rígido da inflação não derrubaria a economia para zero, mas poderia interromper um ciclo de crescimento que tem sido eficiente para gerar empregos e melhorar a vida dos brasileiros, sobretudo dos mais pobres.
A presidente está bancando uma política desenvolvimentista com mais clareza do que fez seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, no seu segundo mandato. Essa é uma boa notícia.
O lado ruim é flertar em excesso com o dragão da inflação e ficar no pior dos mundos: juros altos, inflação alta, estímulo à reindexação e queda do crescimento (caso o mercado financeiro e os empresários não comprem o projeto econômico de Dilma).
Pelas palavras da presidente, inflação menor mesmo só de 2015 pra frente.
Outro tema importante da economia: é sábia a cautela em relação ao câmbio. O real valorizado preocupa o governo. E incomoda até empresários amigos do PT, que se queixam de desindustrialização em marcha. Na opinião desses homens de negócios, falta ao Brasil uma estratégia clara para enfrentar a invasão dos baratos produtos chineses.
O cuidado presidencial é inteligente porque os Estados Unidos e a Europa parecem que estão brincando com o perigo, cada um deles do seu jeito. Os EUA precisam crescer e, para isso, aumentar o teto de endividamento público. Mas a oposição republicana a Barack Obama atua de modo insano. A Europa hesitou demais ao fazer o que tinha de fazer: salvar a Grécia à custa de aumento da despesa fiscal de toda a comunidade.
Ao falar do real valorizado, soou sensato Dilma dizer: "Você acha que a gente pode fazer alguma coisa se a gente não sabe se o pessoal está brincando na beira do abismo ou se já criou uma rede de proteção?".
O governo prepara medidas paliativas para amenizar os efeitos negativos do câmbio sobre a produção, mas aguarda uma definição sobre o destino econômico das duas maiores potências globais. No cenário pessimista, parece melhor contar com um real mais forte, que possa perder valor de um jeito menos prejudicial à nossa economia. Resumindo: vai empurrando com a barriga o problema cambial por falta de meios e condições políticas para resolvê-lo sem guinada na economia.
Política
"Sairão todos os integrantes do Dnit e da Valec", afirmou Dilma.
A frase dura está mais para uma retirada estratégica do que para uma subida de tom e de atitude. A presidente já considera que foi bastante pedagógica com seus aliados, sobretudo o PR. Julga melhor parar por aqui. Ela tem limites para acionar a guilhotina.
O governo quer acabar com a crise entre o Planalto e o PR não tão depressa que pareça ter exagerado nem tão devagar que sugira o desejo de rompimento real.
O PR tem seis senadores e 39 deputados. Sem o partido, a governabilidade seria fortemente afetada. Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) no Senado deixaria de ser uma miragem.
Dilma acertou ao agir com firmeza no caso de corrupção no Ministério dos Transportes. Ficou bem na foto perante a opinião pública, especialmente nos estratos médios mais refratários ao PT. Mas não foram apenas os políticos do PR que ficaram contrariados com sua demonstração explícita de intolerância à corrupção. Aliados do PT e do PMDB também julgaram que a presidente desgastou a já desgastada classe política para se fortalecer na sociedade civil após o dano de imagem que sofreu no caso Palocci.
A atitude de Dilma poderá ter um custo político alto mais à frente, num momento de dificuldade que não envolva a periferia do poder, mas o seu centro.
Imprensa
Dilma deveria falar com mais regularidade com jornalistas. E deveria aceitar conversas sem restrições para gravações. Seria mais republicano. O país e ela ganhariam.
Oposição.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a cavar com sucesso um trabalho numa instituição internacional para José Serra. FHC acha que Serra, candidato presidencial do PSDB derrotado no ano passado, deveria ter saído de cena por algum tempo. Crê que teria sido conveniente uma quarentena, para o bem do próprio amigo. Mas Serra preferiu tentar buscar logo um lugar no palco para a sucessão presidencial de 2014.
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