sábado, 14 de agosto de 2010

PELA BOCA MORRE O PEIXE

RITA SIZA
O treinador vilipendiado por todos virou vítima da imbecilidade da federação portuguesa.
AQUI EM PORTUGAL andamos a discutir há coisa de uma semana se o selecionador nacional de futebol pode ou não irritar-se e dizer uns palavrões em público. Foi isso que o técnico português Carlos Queiroz fez, em maio passado, quando uns senhores doutores irromperam, bem cedo, pelo hotel onde dormiam os jogadores, para diligentemente proceder a análises antidoping.
Parece que o Queiroz não ficou muito satisfeito e dirigiu uns impropérios contra os médicos e mais as mães deles.
Esta é uma discussão tonta e absolutamente irrelevante, mas também muito divertida. E o mais divertido de tudo é isto: três meses depois do incidente, o Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol abriu um inquérito e instaurou um processo ao selecionador, acusando-o de injúrias.
Ele impediu que os testes antidoping fossem efetuados? Não. Ele conspirou para adulterar os resultados? Não. Ele ameaçou ou bateu nos médicos? Também não.
Ele fez aquilo que fazem treinadores, jogadores, torcedores, jornalistas. Apenas manifestou uma opinião, usando palavras talvez menos elegantes, mas, mesmo assim, perfeitamente identificadas nos dicionários da língua portuguesa.
Se for considerado culpado, Carlos Queiroz pode ser multado (num valor que pode ultrapassar os 10 mil), suspenso (de um mês a quatro anos) ou mesmo expulso do comando técnico da selecção. De repente, o treinador que toda a gente vilipendiava e queria ver crucificado depois de Portugal ser eliminado da Copa do Mundo da África do Sul virou uma vítima da prepotência, da arbitrariedade e das instituições que gerem o futebol português.
A coisa virou definitivamente um circo quando o Queiroz chamou para testemunhar a seu favor o Alex Ferguson, treinador do Manchester United, o Pinto da Costa, dirigente do Futebol Clube do Porto, e o Luís Figo, que agora é diretor desportivo. Porque eles estavam lá e podem contar tudo o que aconteceu? Ou porque eles nunca ouviram o Carlos Queiroz dizer um palavrão? Não sabemos.
Sinceramente, devíamos ter todos mais do que fazer. Se a federação portuguesa não quer ter um treinador que fale em calão, que despeça logo o Queiroz de uma vez, mas não arranje processos que insultam a inteligência e paciência de qualquer pessoa sensata.
"É uma tempestade num copo sem água", resignou-se o treinador. A mim, a imagem pareceu-me demasiado literária. Dadas as circunstâncias, eu recomendaria novo uso do português vernáculo.

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