quarta-feira, 16 de junho de 2010

A LÍNGUA DE DUNGA

PASQUALE CIPRO NETO.
Conselho para Dunga: erre nos pronomes, nas concordâncias, mas não erre na mentalidade.
NA COPA de 98 (vencida pela França -o Brasil foi vice, lembra?), depois da derrota para a Noruega, o capitão Dunga deu uma entrevista em que afirmou: "Nossa língua é os pés. Não adianta ficar falando. Nosso negócio é jogar". No dia 2 de julho de 98, publiquei um texto nesta Folha em que discuti a questão da flexão do verbo "ser" escolhida por Dunga.
Repito a explicação sobre esse caso: com o verbo "ser" no singular, enfatiza-se o sujeito ("Nossa língua"); com a opção pelo plural, mais comum em casos como esse, a ênfase recai sobre o predicativo ("os pés"). Relembro como concluí o texto de 98: "Ao conjugar o verbo no singular -ato falho?-, Dunga mostrou que não acredita muito nos pés da moçada escalada por Zagallo".
Pois bem. O hoje técnico Dunga parece passar à sua moçada a mesma orientação. Dia desses, Robinho foi advertido por ter dado entrevista a uma emissora de TV durante uma folga. Quem fala mais agora é ele, Dunga, o chefe, que não usa mais os pés, mas a cabeça...
E a cabeça de Dunga volta e meia diz coisas totalmente dispensáveis. Veja-se o que disse (ou não disse) o técnico do Brasil sobre a ditadura e a escravidão: uma patacoada atrás da outra.
E sobre a bola? Como 99% dos boleiros brasucas, Dunga quase sempre diz o óbvio do óbvio do óbvio. Seu discurso é recheado de frases feitas, de chavões, y otras cositas más.
Agora, desde que recebeu algumas críticas por sua linguagem sofrível, Dunga meteu-se a demonstrar preocupação com o "vernáculo". Ontem, na entrevista coletiva, mais uma vez Dunga se corrigiu ao dizer "com nós", que trocou por "conosco". Em seguida, disse que o time perdeu "bastantes oportunidade". Exatamente assim: "bastantes oportunidade". Melhor não inventar, professor! Que "bastante" tem plural, isso lá é verdade, mas usar assim é outra história. Uma boa dica para não errar no uso de "bastante" é a seguinte: quando cabem as formas "muitos" e "muitas", cabe "bastantes" ("Os jogadores perderam muitas/bastantes oportunidades/ muitos/bastantes gols").
Quando se usam "muito" e "muita", cabe "bastante" ("Eles/Elas estavam muito/bastante calmos/calmas"). Quer um conselho, professor Dunga? Erre nos pronomes, erre nas concordâncias, mas não erre na mentalidade, na aversão ao novo etc. Já pensaram o que não teria feito Ganso ontem com os pobres patos norte-coreanos? É isso.

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