sexta-feira, 2 de julho de 2010

PESADELO AMARELO

FLAVIO GOMES - BLOG DA COPA
Sem querer tripudiar sobre o cadáver de ninguém, haverá quem o faça, na verdade há fila, é só pegar a senha, Dunga é uma figura quase épica para o futebol brasileiro. Teve duas eras batizadas com seu nome. Símbolo do mau futebol da Copa de 90, é, agora como técnico, o símbolo da intransigência, da intolerância, da teimosia e… do mau futebol.
Que no fundo é o que importa, personalidade do treinador à parte, a ela voltaremos daqui a pouco. Mau futebol porque seu conceito do jogo de bola é um pouco diferente daquele que leva a um bom futebol. Ele montou um time eficiente, sem dúvida, com números impressionantes, títulos, mas… mau futebol.
Mau futebol porque ele insistiu em formar um batalhão de soldados em vez de um time de futebol. O futebol, no Brasil, não encantava ninguém fazia muito tempo até aparecerem os meninos do Santos no começo deste ano, e eis que a luz se fez, e eis que as trevas seguiram no batalhão comandado pelo sargento.
É uma questão de gosto. Eu gostaria de ver o futebol dos meninos do Santos na África do Sul, esse é o futebol que, afinal, está sendo jogado no meu país.
Mas Dunga tem outras ideias, e tem todo o direito de tê-las. E não levou ninguém. Levou seus cabos e soldados, que lhe foram leais por anos a fio. Ocorre que futebol não é uma guerra e não carece de rechear um time de cabos e soldados armados com espingardas e trabucos. É preferível usar jogadores de futebol, bons, se possível.
O discurso da coerência, da lealdade, do patriotismo, do orgulho de vestir a camisa amarela, tudo isso pode ser muito bonito para consumo externo, e funciona, basta ver os índices de aprovação do técnico até ontem, 69% — amanhã caem a zero. Porque discurso não ganha jogo. É preciso bola. O time do Brasil jogou bola na Copa, de verdade, contra o Chile, uma seleção fraca, e no primeiro tempo contra a Holanda. No segundo tempo, foi engolida por um time melhor. De jogadores bons.
Dunga é um cara sem grande imaginação. Honesto nos princípios, aparentemente, mas limitado na criatividade e no trato com as pessoas. E um time de futebol é, via de regra, um reflexo daquilo que seu técnico pensa e de como age. Quando vi, no segundo tempo, o Dunga esmurrando o banco de reservas, pensei cá com meus botões o que estaria passando pela cabeça dos jogadores, que olham para o técnico atrás de respostas e só percebem cacetadas e descontrole.
Aí o time perdeu a cabeça, o Felipe Melo foi expulso e, claro, será o Roberto Carlos desta Copa. O cara que não abaixou para arrumar as meias, mas rasgou a do adversário. É fácil eleger vilões, no futebol.
Não há, porém. Futebol é um jogo, um jogo de bola encantador, que resume em 90 minutos tudo que uma vida inteira nos oferece, com seus erros e acertos, alegrias e tristezas, esperanças e frustrações.
Um time de jogadores não muito bons, com algumas exceções, dirigido por um técnico sem imaginação e em permanente estado de tensão e belicismo até poderia ir bem longe, porque o futebol brasileiro é forte e o time tinha lá suas qualidades defensivas e sua eficiência no ataque. E numa Copa, às vezes, isso é o suficiente, são apenas sete partidas.
Mas ainda bem que não foi. Seria a vitória da mediocridade. Do sem-graça, do que não nos cativa, do que não nos encanta.
É o fim da segunda era Dunga. Um sujeito que, sinceramente, não me é alvo de admiração. Não admiro quem levanta uma taça de campeão e xinga o mundo à sua volta. Não admiro quem adota como norma de comportamento a afronta, a agressão verbal, a militarização de um esporte. E tampouco admiro as pessoas que nos últimos anos se apossaram do futebol brasileiro através de sua entidade oficial, um balcão de negócios milionários que nada têm a ver comigo, com o futebolzinho que vejo todas as semanas nas arquibancadas duras do meu Canindé sem vuvuzelas, mas com bolinhos de bacalhau e tremoços.

Nenhum comentário: