O editor da coluna, Junior de Paula, traduz em texto, e o fotógrafo Gabriel Wardil, em imagens, a cidade amazônica, sede da Festa mais importante do Norte do país.
Em tempos de Copa do Mundo, a melhor definição para a profissão de jornalista seria bem representada pela máxima de que se trata de uma caixinha de surpresas. Em uma quarta-feira, eu estava sentado na redação do Jornal do Brasil e, no dia seguinte, às 6h, estava no aeroporto Santos Dumont, embarcando rumo a Parintins, onde rolava a 45ª edição do Festival Folclórico, que divide, com toques surrealistas, a cidade em duas cores: azul e vermelho, cores dos bois Caprichoso e Garantido. Mas até visualizar uma das festas mais bonitas que já presenciei, o caminho foi longo. Muito longo. Até Manaus foram seis horas – entre avião, espera em aeroporto e fila para decolagens. Da capital amazonense até Parintins, uma cidade de pouco mais de 100 mil habitantes, a segunda maior do Amazonas, localizada no meio da Ilha de Tupinambarana, foram 18 horas de barco, Rio Negro, Solimões e Amazonas acima. No porto de Manaus, eu e todo o alto escalão da Coca-Cola Brasil, a empresa que convidou a coluna, embarcamos no Iberostar Grand Amazon, um navio de água doce, com 74 cabines, piscina, restaurantes e tudo o mais que você possa imaginar. Programação intensa durante as noites com direito a show de flauta andina e boate bombando madrugada adentro. Era o que os funcionários me disseram, porque passar a noite em uma boate no Rio Amazonas não era o meu ideal de diversão. Preferi passar parte da madrugada no deque, olhando o céu da floresta que parecia computação gráfica, tantas eram as cores, luzes... E sem falar na lua, que se o homem ainda não tivesse pisado por lá, eu juraria que era um cenário inventado por alguém que queria me impressionar.
Quando acordei, já estávamos atracando no Kuat Club, nosso ponto de apoio na cidade de Parintins, localidade que recebe cerca de 100 mil turistas no último fim de semana de junho, data na qual se celebra o Festival Folclórico. Era sexta-feira, quase hora do terceiro jogo do Brasil na Copa do Mundo, contra Portugal. A partida não valia muito, o placar também não foi lá essas coisas, mas a experiência de assistir ao jogo no meio da floresta, coração do país, me fez ser um pouco mais patriota. E olha que o ufanismo não é das minhas qualidades mais recorrentes. Realmente, há coisas que só o ‘Avatar’ faz por você. Depois do jogo, as horas se arrastavam, já que a expectativa para conferir o primeiro dia das apresentações do Caprichoso e do Garantido, no Bumbódromo, estava nas alturas. Eu já tinha decidido todo o meu amor pelo Caprichoso e, aos poucos, fui conhecendo mais sobre as peculiaridades das torcidas. Soube que o Caprichoso é o boi rico, nariz em pé, quase elitista. E o Garantido era o boi do povão, não à toa as ruas estavam cheias de bandeiras do Flamengo e camisas do time da Gávea. Tipo irmãos de povo, sabe?
Resolvi dar uma volta pela cidade para passar o tempo. O Kuat Club disponibilizava transporte até o centro da cidade, mas decidi ir caminhando, sentindo um pouco da atmosfera e procurando entender melhor como deveria ser morar e viver em uma ilha que se transforma por três dias em um teatro a céu aberto, com enredos sofisticados e cenários que fariam o belo Carnaval do Rio corar. Foi cerca de uma hora de caminhada até a praça central da cidade, onde todo mundo se reúne para dançar no meio da rua e beber, claro. Em frente à catedral, na maior paz, com vermelhos e azuis misturados, sem grandes celeumas. No caminho, descobri que o tal “flal”, anunciado em várias placas pregadas às casinhas, era sacolé. Que o tratamento de esgoto é praticamente inexistente, que muitas das casas, feitas de madeira, têm chão de terra e que todos se conhecem pelos nomes. Descobri também que a boa vontade do povo parintinense é comovente. Sempre pronto para uma palavra amiga, uma ajuda ou uma sugestão do que fazer. Sempre com o sorriso no rosto. Como se os problemas que aquelas pessoas enfrentam, e devem ser muitos, não existissem, esfregando nas nossas caras que a felicidade está nos detalhes, nas pequenas coisas. E não deve ser, de forma alguma, um fardo, como nós, muitas vezes, transformamos a busca pela felicidade. A festa, em si? Um luxo, linda, dinâmica, tradicional, repleta de encantos, emocionante e inesquecível. Mas o que não vai sair nunca mais da minha memória, mesmo, será o sorriso estampado na boca e nos olhos de cada morador de Parintins.
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